( Texto pertencente ao duo Grazzi Yatña e Paulo Castro. Pode ser lido separadamente, ou em parceria com http://grazziencontro.blogspot.com, para melhor apreciação).
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Essa será apenas mais uma vez. Quem sabe a cordilheira dos Andes, ou a pensão mais perto da rodoviária, na cidade em que a vontade de fumar me fizer descer. Nos primeiros tempos, você ligava o chuveiro na água fria - para que o som da eletricidade não abafasse em meus ouvidos as lágrimas, a cena de cineminha cult, e a pretensa culpa semeada - e mesmo assim eu tranacava a porta por fora, respirava fundo e pensava coisas muito particulares e pequenas, como: - Mundo, aí vou eu.
Você também já fizera o mesmo incontáveis vezes.
O que me perturba hoje é o incontável.
No que ele tem de fatalismo ( "de nada serve, acabarei voltando, trazendo um suco de soja na mão e silêncio no corpo) ou se realmente existirá um ato que seja definitivo. Um dia o lobo vem mesmo, pequeno Pedro. E de tão incontável, não sei se estou saindo ou chegando. Te deixando mais uma vez ou retornando. Ou sabendo da (perigosa) lógica, sendo um cavalheiro e levando essa mochila ( como é leve!) para o táxi que na verdade, você nem se dá ao trabalho de resolver comigo o enigma, que na real, é teu e te espera, quem sabe.
Das vezes em que você foi, após desligar o telefone "um carro aqui na...", eu ligara imediatamente, invariavelmente, também em alto e bom som chantagista para o avião de drogas.
- Que morra, seu puto !
Não. Você dizia isso quando ficava debaixo do chuveiro. E nem era "puto", essa raiva tão apaixonada, irasciva e cuspilenta. "Perdedor". Era algo assim, que passava por aí.
Só que imponderável mesmo é saber se entro ou saio agora pela porta. Pela abertura da cozinha, você pica cubos de tomate. Seu vinagrete é invencível. Faz porque amo e me ama e me recebe de volta ou para saber o que perco ? Nem isso nem aquilo. Aqui não se trata nem nunca se tratou de opções e seus festejos. Como é definitivamente leve essa mochila, ou apenas as costas que me pesam mais um pouco, cada qual deveria saber o peso da coluna cervical que carrega em sua paixão.
- Parado esperando o que ? - A faca não jogada, arremessada, invocativa. Nada, colocada de lado com calma, para que junte os cubos de tomate com as palmas molhadas das mãos.
- Dessa vez eu não volto.
- Volta pra onde ? - e ria, riso sem som, esboço unilateral de lábio. Me dê uma pista ou. Ou. Qualé? Não pode ser tão infame assim. Ir ou voltar. E a indiferença entre uma coisa e outra. Claro que pode. E é.
- Não volto para casa, para você, para o que...
- Esquece. Não tem importância.
A buzina lá embaixo. Um toque. Logo dois. Entramos em cena brevemente.
- Vem comigo.
- E o vinagrete?
- Não há de ser, porra.
- Quem sabe em vinte minutos. Tenho que ficar de olho nos pepininhos mergulhados no aceto balsâmico.
- Nem pensar. Eu vou. E pode ser definitivo.
- Não se esqueça de trazer as torradas.
- Eu te amo...
- Vá lá. Eu também. Mas nunca mais daquela padaria. Coisa intragável.
- Me mate agora, se mate agora, ajoelhe e beije meus pés, fique nua, faça um surrealismo desesperado, quem sabe então nem eu, nem você e tudo como...
- Se for o caso, cuide os pepininhos? Só tire em vinte minutos. Para cortar você não tem a mínima competência. Perde todo suco. Alguém precisa ficar pra cuidar dos pepininhos.
Três buzinadas, três afoitas.
- Bom, se você se nega, tapa os ouvidos ao meu desespero...
- As torradas. Olhe o que colocam no saco antes de pesar. Aquelas vacas e suas torradas queimadas.
- É isso, é isso ! Você se nega a ouvir ! Ei, taxista, buzina mais três vezes, com quatro, entre em cena, suba aqui, vamos lá, ela é surda, ela é surda, mas sabe que agora pode ser definitivo ! Ah se sabe, tanto bate até que fura, isso mesmo, não vou cair de joelhos, não vou provocar o vômito, não, nada de partir praí e te esgoelar até a morte ! Nem pense nisso. Tua peça na posição é indiferença, muito do bem, é indiferença que eu darei. Aposto mais em mim. Sim, não tem mesmo a mínima importância.
-...
-...
- Muito bem, então você não erra nas torradas?
- Claro que não. E pensei em um vinho excelente.
- Barato ?
- Os Argentinos. Atualmente, ótimo custo benefício.
- Hum. Morrendo de fome. Pega um táxi pra ir mais rápido.
- Sim, já tinha pensado nisso.
- Lindo. Te amo.
- Volto já, princesa.
- Beijinho, beijinho.
- Veja os pepininhos !
- Tudo em ordem.
- Sim, já volto, tudo na mais perfeita ordem.
º
11 comentários:
nossa. ke mulher insensível...
ela sabe ke ele sempre volta, mas bem ke poderia fazer uma fita , só pra ser mais divertido pros dois :D
... do que se pensa quando ninguém está ouvindo.
É daí que se comete os piores erros, ou se toma as mais perfeitas decisões.
Mas quando o convencimento está em jogo, tudo o que se faz/vê/pensa/fala quando ninguém está dentro da nossa cabeça, pode ser crime inafiançável. Mais ainda tratando-se de relacionamentos.
Texto teu,
belo.
BeijOs!
Trata-se da mais bela forma de rendição:a aceitação deliciosa da paixão que carregamos na mochila e que sempre nos fará ficar, como no gran finale.
É o ponto alto, onde se reconhece que a ardent affection velada, traz toda a segurança em mostrar, inclusive, uma aparente e charmosa frieza.
Admitir a legitimidade do gozo, desfaz as malas pesadas do desespero e mantém tudo em ordem.
Na mais perfeita ordem.
À nobreza soberana de quem se rende aos sentimentos, brindemos.
Beijo Pink,
Márcia.
Azeite é doce.
Vinagrar é preciso.
Não acredito num casal que não seja isso.
Mistura de querer e não querer.
Amor sòzinho não desafia, não constrói nada aquém da porta.
Conheço muito essa coisa de ódio/amor/ódio sendo que o ódio pesa mais.
Mas cria.
Essa coisa de benzinho, te quero e te gosto 24 horas/dia é histeria disfarçada.
O que que faz com a porta?
Abra sorrateiramente em caso de ter tido um caso na rua.
Feche apressadamente em caso de ir ter o caso.
Bata estupidamente em caso de necessitar fazer gênero.
Deixe entreaberta no caso de ser daqueles (as) que não acreditam que aguentam a presença do outro.
Grafite.
Cactus, florzinhas do campo jamais.
A arte provençal é para meigos e meigos não têm alma não.
São como Franksteins de si mesmos.
Isso!
Ódio não é versus amor.
Ódio é tempero - o vinagrete.
E a indiferença é estandarte a ser balançado em momentos de necessidade.
Dói? Dói.
Mas tudo dói.
Principalmente o medo da dor.
Bobageira, porque estar junto dói tanto quanto estar separado e saudade se tem é de si mesmo dentro da história.
Saudade do incômodo que se é e do que se suporta.
Conto REALMENTE...
la indiferencia.........pesa mucho en la mochila, ganas de matar, con vino Argentino, el Chileno da ganas de besar...E pepino, el vinaigrette y mucha mentira, quien ama se asusta, corre y agarra...la indiferencia.....es apenas una forma de decir Vete al carajo con tostadas y mas........no regreses...se parece al cansancio.
Yo también te amo.
Saca cena de filme em que espiões trocam de maleta e algum gaiato fora do script se fode por último, com uma bomba na mão, e vira até herói? Me amarro naquilo!(pensando em mochilas)hihihihi
Gostei. Aguarde a minha próxima mochila.
bjo.
Saca cena de filme em que espiões trocam de maleta e algum gaiato fora do script se fode por último, com uma bomba na mão, e vira até herói? Me amarro naquilo!(pensando em mochilas)hihihihi
Gostei. Aguarde a minha próxima mochila.
bjo.
no taxi, de portas abertas, "vai demorar?"
É assim o amor. Ele passa por cima de todos os egóicos ensaios, de todos os cotidianos desafios que a razão cheia de lógica nos impõe, e sobrevive, insolente, insano e inocente sem perceber que o túnel se estreita adiante. Mas é um preço que todos pagamos, cedo ou tarde, pela ousadia de um encontro nada casual.
Adorei!
Bjs
Bem, os comentários sobre seus contos são um conto à parte rs... visceral , Paulo!
Ou eu não conhecia esse seu estilo, ou consigo reconhecer muito pouco do Paulo aí. Gosto dessa realidade. Sempre preferi e me atraí mais por realismos que ficções ou romantismos.
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