quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

O Porre dos Malacos.


1)
- Por que você é tão anti-social ?
- A sociedade que é anti-social. Eu até que me dou bastante bem com quem sobra.
- Por mim, vai. Por mim. Levanta daí, coloca uma roupa. O cara está morrendo.
- Ah...uma coisa aqui no meu peito...acho que dessa vez eu vou. Fui. Adious.
- Pára. Ele é meu primo mais velho. O único cara que me entendeu quando a gente estava em crise.
- Eu não gostaria de me emocionar agora. O dr. Eduardo falou pra eu me reservar. Posso conseguir um atestado contra primos com câncer no fígado que entendem crises conjugais alheias. Segunda-feira te entrego.
- No fígado mais quinze metástases cerebrais.
- Sei. Ele foi...aquele...o único a te ententer?
- Foi. Ele mesmo.
- Vamos.
- Você muda mesmo rápido de opinião. Nunca sei.
- Nunca saiba. Melhor pra você.
°
2)
Uma casa de luxo. Você abre a porta e praticamente já está dentro da piscina. Só não cai na água porque o bar está a esquerda. Ela vai me apresentabdo para as pessoas, que vão me beijando, me apertando a mão, me dando nojo. Pular na piscina de roupa e tudo. O filho tatuado e sarado conta como vai ser bacana casar com alguém chamada Poli na Inglaterra. Descubro que Poli é ou um cachorrinho toy que late pra mim desde a hora que eu cheguei ou uma mulherzinha magra, perfeita, boas tetas, bunda adequada e um ar de elegância que beira a idiotia. Começo a mostrar a língua primeiro pro cachorro depois pra moça sentada no banquinho, coluna ereta. Nessa o toy pira e eu descubro na bronca que ele chama Malaruche. Poli é a inglesinha mignon perfeita e com crises epilépticas controlada a duras penas pelos maiores neuro-cirurgiões de Oxford. Tenho certeza que embaixo da cabeleira loira há uma dúzia de cicatrizes. Poli, olhe minha língua, Poli, vamos foder na piscina, Poli, olhe a velocidade com que eu consigo mexer isso aqui, Poli, vai tomar no meio do teu cu a serviço da majestade.
A família é grande. Não é a minha família. Dá a impressão de não ser a família de ninguém, mas uma cena que desgrudou de algum filme, outro carinha tatuado, pega o primeiro e se trancam no banheiro, uma velha que bate no peito e repete aos brados "Vou fazer 90 anos em abril", e um grupo assustador de senhoras uns bons saltos além da meia-idade. Todas com a mesma cor de pele. Montam a armação em meio-círculo. Olham pra mim. Penso em correr, Malaruche late selvagem e antes que eu possa chutá-lo da barra da minha calça, lá estão as senhoras, em uma estratégia de ataque pra Sun Tsu nenhum botar defeito. Estou cercado.
- Ah, você bebe alguma coisa, querido ?
- Sim...sim...uísque....
- Ah, estamos todas tão transtornadas.
- Ah, a doença do Dingo.
- Dingo ?
- Ah, meu marido - não sei qual delas deu a resposta. Ou todas elas.
- Sei. Grande Dingo. Obrigado. Sem gelo mesmo.
- Ah, sirva-se, deixei a garrafa ali...
Saco bem onde é o "ali". E acolá, os copos.
- Ah, mas ele está recebendo três vezes por semana a visita de uma terapeuta floral, que aplica cristais sobre os chakras. Você sabe, a gente pode curar a nossa vida. Soube que você adora ler. Que é escritor. Já leu Louise Hay ? A Gasparetto sempre diz que a gente precisa deslocar a energia da morte para onde está a vida...
- Onde está a vida?
- Ah ! Você é ótimo.
- Ah, ele é ótimo !
- Ah, você surfa ? Todos nossos filhos surfam. Só na surfa a Cris, tadinha, ela tem diabetes, bulimia. Mas está noiva. Deve se casar em Estocolmo. Para uma moça com tantos problemas até que Estocolmo já é alguma coisa, né querido ?
- Sem dúvida. Já vejo o slogan "Eu como em Estocolmo: Patrocínio Insulinas de Porco".
- Ah !
- Ah !
- Ah, deve ser humor, né ? Dizem que os escritores...
- Cadê o Dingo? Gostaria de vê-lo.
- Ah, bem, ah, ele fica em um dos quartos lá em cima. A gente não quer misturar o clima festivo com toda essa tristeza. Mas a cada hora uma de nós sobe lá e faz um carinho, lê um pedaço de um bom livro de Salmos Dos Anjos Cabalísticos, limpa o dreno dele e levamos verduras, muitas verduras.
- É. Eu realmente gostaria de vê-lo.
- Ah, um dos meninos leva você. Meninos ? Meninos ? Poli...i don't see...
- O quarto lá em cima. Não se preocupem. Poli pode rachar. Eu me viro. Não se preocupem em levar nada pro Dingo. O Maraluche também precisa de atenção. Né, verme ?
- Au au au au au au !
- Ah, Maraluche, pare lindo !
- Au au au au au au au au au au au !
A garrafa de uísque. Os copos. Questão de dar um salto e distrair...
- Maraluche, seu bostinha, pegue isso.
E lá se foi o coisinha atrás do cigarro. As mamães atrás. Minha oportunidade.
- Ah, ah !
- Ah, é um biscoito, que gentil !
- Ah, é um cigarro ! Larga Maraluche, não engole !
- Ah, engoliu !
- Ah, ele está ficando com os pêlos azuis...
E eu já estava na escada. E armado.
°
3)
Tranquei a porta por dentro.
O quarto fedia merda, bile, verduras da semana passada.
Abri a janela.
Lá embaixo, uma correria danada e depois silêncio. Pobre Maraluche. Veterinários existem também pra isso. Cães fumantes.
Enfim, Dingo:
Deitado na cama.Roxos por todo corpo, pernas inchadas, um cano transparente que saia de sua barriga enorme e babava um líquido negro.
- Dingo, abre o olho. Sei que você não está dormindo.
Ainda de olho fechado:
- O que você quer ? Não respeita um doente terminal ?
- Quero matar essa garrafa de uísque com você. É do bom. Um dos seus, é claro.
Na hora ficou esperto. Agitou. Babou um pouco no canto dos lábios.
Puxei a poltrona e trouxe pra perto da cama. Me servi e depois coloquei uma boa dose pra ele.
- Deixa eu te ajudar. Mais uns travesseiros. Você babando me enoja, Dingo.
- Isso, assim, assim está bom...
- Tim Tim.
- Tim Tim. Quem é você ?
- O marido da sobrinha que você meteu ano passado, Dingo. Ela estava se separando, você aconselhou. Uma semana antes do carnaval. Ela voltou pra casa. Uma quantia de grana alta apareceu na nossa conta conjunta. Eu saquei tudo, a trepada e a grana, antes que ela pudesse se tocar.
- Eu juro...eu nunca iria...
- Dingo. Pare. Vou chamar a sua terapeuta dos cristais. Relaxe. Somos do mesmo tipo. Só que você vai morrer em algumas horas e eu vou continuar por aí.
-...você é o tal escritor que não presta, que faz a coitadinha da....
- Dingo, Dingo. Você está me irritando. Só vim tomar uns uísques com você. Juro que esse papo de saladas está te trazendo o inferno.
-...
- Né não ?
- Pior que está, cara. Vai me serve outra dose.
- Boa.
- Quer dizer que você ficou com a grana. Que grande filho da puta !
- Somos, meu amigo, somos. Mas apliquei bem o seu dinheiro. Coleções completas. Flaubert. Balzac. E discos. Que discos. Bem diferente dos seus moleques que gastam em pó, pranchas e gostosinhas que nem sabem que você existe. E nem querem saber.
- Porra. Pior que é verdade. Me acende um cigarro desses.
- Pega o meu. Acendo um pra mim.
- Ah....que delícia !
- Traga bem. Aproveita. Mas o maço tá cheio. Tem mais de onde veio esse.
- Ótimo. O que é um peido pra quem já está todo cagado?
- Gostei dessa. Posso usar em um dos meus livros ?
- Claro. Se no inferno tiver biblioteca tenho certeza que os seus textos passados, presentes e futuros estarão por lá. Pelo que ela me contou.
- Ela não sabe me ler direito. Se você ainda tivesse tempo eu me recomendaria pra sua ociosidade. Mas imagino que morrer dá um trabalhão.
- Nem te conto. Mas chega sua hora. Mais uma dose, por favor...
- Toma. Caprichada. Pois é, Dingo, mas quando chegar minha hora, espero não estar cercado de gente tão escrota quanto você. Que merda de circo é esse ?
- Como você acha que eu fiquei rico, moleque?
- Uma das donas.
- Bingo. Você continua pobre porque casou com mulher bonita. E bem gostosa. Boas lembranças dela.
- Você prefere que eu peça pra ela subir te bater uma punhetinha ou quer ficar aqui bebendo. Se bem que não sei se ela também não foi acompanhar aquele cachorrinho viado até o pronto-socorro.
- O toy ? Pronto-socorro ?
- Dei um desses cigarros pra ele comer. São fortes, né ?
- Gosto de você, garoto.
- E eu gosto de você, Dingo. Vira aí. Nunca comi um cu com icterícia.
- Que foda. Só rindo. Acho que é mais ou menos assim o jeitão que gente como a gente morre, não foge muito disso, rapaz. Filhos estúpidos, coleção de esposas, amantes, sócio do Iate Clube, uma pilantragem aqui outra ali e quando viu, pumba, já era.
- Deixa disso, Dingo. Louise Ray sempre diz, "você pode curar a sua vida".
- Caralho, seu merdinha. Se eu pudesse me levantar daqui te enchia de porrada.
- Como não pode a gente continua bebendo, fumando e eu esperando você morrer.
- Estou sentimental. Virei um velho bostalhão sentimental. Você tem idade pra ser meu filho. sem sarro agora, imagine que dupla. Hein ?
- Eu teria medo de nós dois juntos, Dingo. Iria ser foda.
- Pobres mulheres.
- Pobre humanidade, Dingo...
- Boa. Serve outra. Tá dando um sono bom.
°
4)
- O plantonista achou um cigarro dentro da porra do cachorro. Eu pedi pra ver. Era da sua marca. Do seu fedor.
- Amor, o vício é mesmo uma coisa triste.
- Sei.
- Relaxa, gata. Apenas continue dirigindo, a brisa está uma delícia.
- Pra quem não queria ir, até que você está com uma cara ótima.
- Gostei do Dingo.
- Sério ?
- Muito sério.
Eu deveria estar mesmo com uma cara ótima. O bolso de trás da calça melhor ainda. O cheque de Rodrigo Alcantâra de Menezes. O Dingo. A letra tremida um pouco, mas eu ajudara com um apoio. Assinou me chamando de "filho" e chorando. Eu agradeço a quantidade de zeros, Dingo. Só espero não chorar no final. E se chorar também ? Alguém tem alguma coisa com isso ? Pois então, fodam-se.
°

sábado, 24 de novembro de 2007

A Noite da Tertúlia.


Imagens próprias, imagens alheias, o espelho esfumaçado, cheiro de sabonete, papel higiênico respingado. Enquanto em algum lugar, do outro lado do telefone faringe inflamada ( cigarro filtro branco), você lambe restos de sol, eu não posso evitar as junções: o sabonete limpa, o corpo suja.
De noite não, ah de noite não.
Rendinhas: vou com os dentes.
De noite não: teu corpo é teu papo de alma e o que se torna palpável é porção de mágica, mas vem cá, enfia a língua entre meus dedos, no vão dos prédios ( dormem ? amam ? amarram cordas no chuveiro ?), no vão entre meus dentes. Na sombra atrás da banca de jornal, sou cancioneiro gitano, como Lorca, mas sem ter a rigidez regida: os astros estão brilhando na ponta de seus pêlos e apenas aí, movimento de marés, arrebentação quente.
Na noite sim, umidifica.
O mais palpável é um abraço troncho que te dou e nos leva ao chão, escoriações e arranhões anônimos, risos: renomear o corpo, caos vocabular de anatomia, neologismos inaudíveis para táxis que por muito não nos atropelam ( "i have money", você tem tatuado ironicamente, globalização de varas verdes nesses arredores sertanejos, bem ali, no pinga-pinga, pisca, da pelve), a cabeça agora se chama "coroa", os pés ( ah, os pés, chinelinho que te escapa, mordido pelo bueiro, jacaré autômato e sacana) se chamam "obra por vir de língua".
E me diz no vão dos fios ao céu pendentes, me diz amorico, levantar pra que?
Fazer aos olhos do deserto noturno ( passa sim alguém, um gavião negro de olhos empedrados e fascinantes) a falcatrua de que não somos tronchos ? Que não reinventamos descaradamente o nome de tudo que nos interessa e só a nós nos interessamos por nós?
O mundo é uma cama.
De noite, bem de noite, eu sei, você insinua saber, com esse umidificar palpável que acelera fantasias prenhes na velocidade além da pobre, vaidosinha coitada, luz. Afinal, é de noite.
Rendinhas no meu estômago, o cheiro do sabonete tesão agora, liga os olhos do gavião que se faz metrô adormecido, lâmpadas esquecidas, meio assim como obra de arte: luminosidade que ninguém vê, fora a mão burocrática de chave que ainda, bem ali, naquele prédio que ronca trovões no para-raios, dorme o responsável por aqueles que acham alguma utilidade em se levantar.
Não, deixa lá o chinelinho, entrega o outro para a escada, que hora dessas, só desce, infinitamente, só desce capacetes de anjos decapitados, entre galhos inicialmente tímidos, que logo, escute o som gralhar, se tornam mata densa, irretocável: a descoberta de um continente, dois dedos no sexo.
Chinelinho alimento de bicharada.
E meu
entrar aqui em você é alimento ( noite arranhada, disco vinil),
para dois bichos que ao invés de fisiologia factual,
sabem das duas únicas coisas naturais:
fantasia e memória, assim se respira, assim...
°

domingo, 19 de agosto de 2007

Os Adúlteros.


Entra, senta, quer ouvir um som, tomar um café, ainda é cedo pra uma cerveja, beber agora te lembra a culpa de estar aqui ?
Seguro você pelas pernas, quase cai, grita mesmo, levanto e te colo na parede, só entende o que acontece quando com a língua puxo de lado a calcinha e vou lambendo de boca inteira, rosto: com um dedo, você me ajuda.
Cheiro e gosto de quem se preparou pra isso. Quero molhar até tirar restos de sabonete e intimidades de farmácia. Agarra meu cabelo onde nascem e minha nuca, tua unha, sangra. Xingo tua mãe, teu pai, teu marido e te jogo no sofá, levanto tua bunda e meto. Você goza em alguns segundos e me diz que pare, que quer conversar, que talvez posso descartar a imagem das responsabilidades, caso bata um papo. Bato sim, bato uma, três, várias vezes e você goza de novo quando puxo tua cabeleira.
Saio correndo e esporro pela janela do apartamento. Lá embaixo, o ponto de táxi, a padaria, o sebo de livros.
Pego duas cervejas. Bebo a minha e depois bebo a sua, antes que esquente: você abraça os joelhos e finge dormir.
- Não é cedo para você estar bebendo ? Eu deveria mesmo estar aqui? E o tempo para pensar em todos prós e contras ?
- Você está sentada em cima do maço de cigarros. Passa aqui, por favor.
- Toma. Pega uma bem gelada pra mim. Tem uísque ?
No banho, como você por trás. Lambe o azulejo, cerâmica insuflada. Temperatura de arrepio e descamação da pele.
°
Telefona e parece que no escritório as pessoas acreditam na história. Eu não tenho para quem telefonar. Faço a barba e você corre pra me abraçar.
- Coloca um som bem legal ? Agitado. Quero dançar! Como estou feliz, amor...
°
O dia está ensolarado e nós de mãos dadas, você balança nossos braços e conta mil coisas sobre umas conquistas, um curso de alemão, e a tese de doutorado. E como sempre gostou de ler minhas coisas.
- O que é sempre ?
- Seu chato ! Me compra um pão de queijo!
Rimos juntos e a criançada chuta bola no muro do cemitério municipal. Parece que nada pode andar para trás, imagino seus pés escorregando no suor da sandália e tenho outra ereção. Mas ali estão seus pés e eu não preciso imaginar porra alguma. Me ajoelho na calçada e beijo cada um dos seus dedos, acaricio as panturrilhas e elas são caules sagrados. A criançada ri. Eu rolo no chão e finjo uma convulsão. Você manda beijos para todos que passam. Ônibus buzina, a tia da banca de jornal bate palmas. E mais que tudo, preciso caçar um pão de queijo em algum lugar que te mereça.
°
Vamos viajar. Vamos comprar um gato. Vamos nadar no mar.
Vamos correr no parque. Vamos cair com tudo no gramado. Vamos rolar ladeira.
Te faço barriga, te faço um livro novo.
Me faz um sorriso teu.
E me diz onde compramos parênteses para colocar no tempo.
Dentro da lanchonete está escuro. Você engole coca-cola. Eu engulo a seco.
°

- Você está legal, amoreco ?
- Vamos voltar pro apartamento.
- Tarado !
- Linda...desde a lanchonete. Já demos volta no quarteirão de cima, vimos as vitrines e comprei essa rosa...
- Maravilhosa.
- Tem um cara seguindo a gente.
- Puta que o pariu. Não brinca.
Você começa a olhar para trás. Belisco seu braço.
- Faz o que eu mandar.
°

O andar está escuro. Apenas a luz vermelha do interruptor. O elevador vem contando os número na parede. E chega. O tipo: alto, blusão imitando couro e manca um pouco da perna direita. Antes que ele possa acender a luz, é nela que eu pulo, colocando meu peso contra o joelho. Um grito e caímos no chão. O elevador desce e tudo escurece. Alguém ouviu o merda berrando. Segura minha garganta e além dos dedos, tem algo frio. Uma lâmina. Chuto com força o joelho, estamos escorregando no piso liso. Ele sente a dor, mas não desiste de aproximar o canivete da minha cara. O motor de elevador treme, zumbe. Preciso soltar um dos braços pra fazer apenas uma coisa e tem que ser rápido. Ele corta uma tira da minha orelha antes que eu arrebente sua cabeça contra a porta de incêndio. Após três pancadas, ele pára de respirar. O elevador ficou parado três andares abaixo.
Toco a campainha e você abre imediatamente. Ao contrário do que eu esperava, você não grita. Me ajuda a carregar o corpo.
Limpa o sangue e os ossos lá fora, enquanto eu ajeito o sujeito no banheiro da empregada.
°
- Meu marido sabe.
- Ele desconfia. Só isso. O que ele tinha pra saber morreu com esse cara.
- Não posso voltar. Ele me mata...
- Você deve voltar. E chegar sorrindo. E trepar com ele.
Parece que ela não pensou duas vezes antes de aceitar a idéia.
- Vou. Mas e você. E o corpo desse filho-da-puta ?
- Isso é comigo.
- Jura ?
- Claro.
- Ai, meu Deus.
- Vai amor, eu te ligo.
- Você vai se livrar, né ?
- Tenho alguns amigos. Espero até a noite. De madrugada não tem porteito. Tiramos ele daqui e levamos pro lixão. Fim de papo.
- É bom eu ir rápido, cê não acha ?
- Acho. Vai.
- Te amo até o fim do mundo.
- Eu sei.
- Vamos nos ver de novo ?
- Com certeza.
°
Dou meia hora depois que ela saiu. Estou com o celular do morto ao meu lado. Na casa dela, eu sei bem, tem identificador de chamadas. Mato-grossenses cornos e com grana.
A carteira de identidade: Macavú- Pernambuco.
Isso me dá um sotaque.
Poupo palavras para dizer que ela está limpa. Teve um almoço de negócios com o pessoal de um escritório, na praça de alimentação do shooping.
"O som tá alto, Casimiro..."
"Tô na rua."
"Tem certeza de tudo ?"
"Segui até o aereporto..."
"Obrigado, Casimiro."
"De nada, é meu serviço."
"Você está estranho...não sente saudades de mim?"
Fodeu.
Lascou.
"Sinto...claro, sinto demais sua falta..."
"Você entende que não era ciúmes dela, não entende? É honra. Honra, meu cavalo. Você ainda é meu cavalo gostoso, Casimiro?"
" Sempre."
"Volta. Vamos passar o fim de semana na fazenda? Quero você me fodendo."
"Quero comer mesmo esse rabo."
"Assim que se fala...cavalo..."
"Me espera na fazenda já? Me deu tesão arretado essa história toda."
"Safado. Puto. Vou dispensar o pessoal do casarão."
A passagem, a passagem....aqui.
"Chego de noite."
"Te espero de banho tomado, vem que teu urso tá querendo."
°
Enquanto remexia nas roupas de Casimiro, encontrei tudo que precisava. Eu já tinha visitado aquela fazenda duas vezes. Foi na carteira que eu encontrei uma foto.
Uma foto dela.
E uma carta escrita em folha de caderno. Eu conhecia bem aquela letra.
E aquele jeito bem puta de escrever.
Ela dizia que o pau de Casimiro era o maior que já havia chupado.
Que ela adorava quando ele esporrava na cara, nas tetas.
Que fora o corno, só tinha ele.
°
Minha cabeça latejava enquanto eu arrumava uma mala pequena. Poucas coisas. Eu não tinha motivo pra demorar lá no Mato Grosso.
Descobri que sou rápido para acertar algumas coisas.
Pedi pra aeromoça um comprimido pra dor e uma cerveja.
Dormi sorrindo, com uma sensação gostosa esquentando o peito.
Algo como um sentido real pra vida.
Ou a alegria do desprezo.
°







quarta-feira, 1 de agosto de 2007

O melhor casal do mundo.



"Quando os demiurgos cahuilla emergiram das trevas e quiseram dissipá-las, ambos começaram por extrair do próprio coração um cachimbo e um tabaco cuja fumaça expulsaria a escuridão reinante."

("A oleira ciumenta",Claude Lévi-Strauss)



- Antes que saia, você sabe que eu te amo, né ?
- Assim eu volto.
- Não deixaria de ir por tão pouco.
- Posso fingir que a gente não entrou nessa apenas pela ironia.
- Simular uma negativa é dizer algum tipo de verdade que eu não consigo escutar.
- Vou só trancar a porta, e telefonar pro síndico na praia.
- O que a gente vai ficar fazendo aqui ?
- Você sabe como funciona essa hora. Qualquer coisa que eu falar não será feita por pura birra.
- De ambos, que fique claro.
- Posso fumar aqui ?
- Está frio e eu não vou abrir a janela de madrugada.
- Obrigado, passe o isqueiro.
- Vem pegar.
- "Vem pegar" sempre termina em sexo.
- Você disse a palavra, a gente não vai fazer.
- Como as coisas ficaram tão complicadas ?
- Você já imaginou a quantidade de conversas que estão inscritas dentro da gente ? Foi-se o tempo em que o decálogo resolvia tudo.
- Eu deixo de dizer o que quero para que você adivinhe, mas você se nega a adivinhar pra que eu me sinta menos óbvia, e isso melhora minha auto-estima, o que me dá coragem de dizer o que eu quero.
- E na hora que você toma coragem, eu decido ir embora.
- E apenas quando você gira as costas, gira a chave, abre a porta, abre o mundo, eu tenho coragem de dizer que eu te amo.
- Agora você me ama ?
- Não.
- Nem eu te amo.
- Amar tem um ranço que acaba matando o amor. Amar tem umas velas, umas bençãos, umas pizzas, uns projetos para as férias, umas enumerações cansativas, bem como o entardecer silencioso, que vai caindo sem que com isso tenha a força necessária pra desviar o curso da luz sobre as palavras na ponta da língua, mas elas não despencam nunca, elas nunca decidem por se espatifarem sobre o jardim, elas...
- Você não consegue ficar quieta ?
- Não. E você ?
- Consigo.
- Então fique.
- Fico se eu quiser.
- Eu fico mil vezes mil.
- Eu fico mil vezes infinito.
- Eu fico infinito vezes infinito.
- O que quer uma mulher ?
- Freud.
- Pense em alguma solução trágica para nós. Posso mesmo sair por essa porta e ir comprar uma arma.
- Eu gostaria muito, mas na hora que você virasse as costas, me assustasse com o prenúncio da ausência, abrisse a porta...
- Você diria que me ama.
- E você iria acreditar, afinal, nós dois sabemos muito bem como é encarar o mundo lá fora.
- Taí. E se nós dois saíssemos? Fechamos tudo, arrumamos as malas, dividimos o dinheiro, e cada um vai pro seu lado, rodoviária, aeroporto, a motoneta a gente tira no par ou ímpar.
- Enquanto um arruma a mala...como seria a solidão do outro que espera, vários uísques com Miles Davis na sala ?
- Arrumamos ao mesmo tempo.
- O nosso armário não é tão grande.
- Nem mesmo o quarto, não caberia eu, você e o terror.
- Concordamos em algo, afinal.
- Alguma coisa deve estar errada.
- Não, é isso mesmo. Lembra ? A gente sempre concorda com os pontos que não trazem solução alguma.
- É verdade. Agora mesmo. Nessa última concordância. Somos capazes de criar tratados, epopéias, sinfonias que versassem sobre os temas mais inúteis, como a tarde que vai caindo em silêncio, sem jogar alguma água sobre esse teu cigarro que se segue a outro e mais outro até que precisemos inventar de ir ao cinema, ver amigos, marcar uma reuniãozinha, encarar barzinho depois quem sabe pegar estrada para a praia.
- Quem sabe não. A gente sempre pega estrada para a praia. Compramos o apartamento lá para pegarmos inevitavelmente a maldita estrada para a praia.
- Nem sempre.
- Pronto. Taí. Você quer ir pra praia.
- Não quero.
- Negar que quer ir é querer ir.
- Você insiste tanto nessa que estou achando que quem quer ir pro barzinho e depois encarar a serra é você.
- E que tal se nós dois saíssemos pra juntos comprarmos a arma ?
- Você não entende nada de armas.
- Quem foi que disse ? Antes de te conhecer eu era muito crazy.
- Eu entendo tudo de armas.
- Eu andava com uma turma super pirada, sem limites, a gente ouvia música, fazia orgia e todo fim de semana...
- ...Vocês iam para a praia.
- Algumas vezes a gente não ia. Você não sabe.
- Desde quando a gente se vê lá no mar ? E aquela foto em preto e branco nossa, na estante dos vinis ?
- Isso não tem nada a ver, você não sabe se a gente se via mesmo todo fim de semana, é impossível fazer esse cálculo.
- O problema é que a sua turma era também a minha turma.
- Como eles, os outros, se chamavam mesmo ?
- Não vou dizer isso.
- Eu digo.
- Eu te mato. A gente combinou. A gente disse aceito, aceito, amém, amém. Purificação do segredinho. Te mato !
- Mata nada.
- Porra, se mato...cala essa boca escrota, seu merda !
- Porque você acha que todos nossos filhos não vingaram ? Porque a caixa de gordura está entupida de tantos fetos ?
- Pára ! Não tô ouvindo nha nha nhu nhu nha nha não tô ouvindo !
- Não paro. E você tá ouvindo sim !
- Você é doente.
- Nós dois temos a cicatriz na barriga. Olha a sua, olha a sua, lá lá lá ! Eu vi ! Ninguém mais viu !
- Bobo ! Bobão !
- Feia ! Coiseira !
- Seu ...seu...mesa !
- Sua xixi de urubu !
- Vou chamar a mamãe, droga!
- Vou chamar o papai! E mais a vovó ! Eu vou, eu vou !
-...
-...
-...
-...
- Voltou ?
- Voltei.
- Você está bem ?
- Acho que sim.
- Não lembra de mais nada também ?
- Nem uma gota de memória.
- Estou leve pra caramba. O que é esse branco ?
- Não faço idéia. Só sei que é bom. Vou lavar o carro pra gente pegar estrada. Vai fazer um fim de semana lindo, vi na internet. Barzinho antes ?
- Antes. Ah, e antes de você sair...quero dizer que te amo.
- Desse jeito eu fico.
- Fica nada...
º

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Eu Pendendo Você: Caio em nós - ( ou Psico-Cigar )


(Foto: Paulo Castro )
Saudades mentirinha de quando o barco( musgo na alma ? Só rindo...) pendia pra algum lado. Agora existe uma calmaria de miséria( os marinheiros pescam fantasias sob a forma de pedaços humanos plastificados), sobrando ao plural capitão pular no mar com a boca cheia de areia, espermartozóides e óvulos, nadar sem mastigar, sem deglutir, cantando uma canção apenas na mente. Mentirinha.
De forma que preciso aqui no navio de doadores e fornecedoras. Não precisam correr, já afundou, já chegamos no pé, agora é uma questão de querer ou não que a barcaça crie raízes e que com isso, constituamos em um futuro impreciso, algo que já se sabe falho: uma sociedade, alguma comunidade, férias com máquina fotográfica, horário para acordar, em que o breakbeast substitui o despertador de trabalho, convenhamos afinal: Proponho uma anti-Arca de Noé.
°
A fantasia é entendida pelo matema:
$ <> a
Onde $ é o sujeito barrado e "a" é o objeto perdido.
Sujeito barrado de que? Essa é fácil: pelo próprio princípio próprio que permite chamar alguém de "sujeito" e que entendamos do que se trata. Sem entender porra nenhuma, na verdade. Barrado pela linguagem. Que se permite o fato de um papo com café na padaria poder acontecer, permite também que a gente se saiba como limitado, nunca o sonho. Ou você acha que sonha apenas quando está dormindo, quando deixa de ser, por que ?
E que objeto perdido, cara pálida ?
Um dia você teve fome e deu que chorou. Pela primeira vez. E sua mãe te faz uma surpresona. Aparece com aquele tetão magnético. A coisa é tão boa que você pensa: Toda vez que eu chorar, vai aparecer algo assim, tão bom ?
E chora de novo.
Mas o que volta é o tetão. Só que você não quer ele. Você quer outra coisa: a surpresa, o gozo dessa novidade. Mas o mundo só te oferece tetão. Ou coisas que sejam substitutas de tetão( clássicos dos Rolling Stones, chocolate, coisas do tipo ). Mas nada mais que tenha tamanho impacto de surpresa satisfatória. O Objeto "a" é essa coisa que você não esperava e veio, e que depois que veio, nunca mais nada virá causar o mesmo. Lacan não disse, mas disso tudo, como podemos deduzir, decorre que após a sucção inicial, só nos resta o tédio e uns balões a cada aniversário. E presente de dia das crianças até sair da casa dos pais. Que pais ?
°
Tem um pedaço de fogo na minha garganta. Bem cortado, dimensionado, medido. Ele não queima como poderia queimar, mas é tudo que tenho. É também o que me cala, ouvindo as pessoas, sem nada mais a acrescentar.
Tem um pedaço de pessoas dentro da minha cabeça.
Tenho medo de levar o fogo para cima e me tornar um assassino. Tenho pavor de trazer as pessoas para baixo e acabar engolindo o pouco de chama que me foi aventado.
Por isso que não sei o que dizer, por isso que também não te beijo.
Você entende ?
É minha, de toda gente, natureza de perpétuo ovo de dragão.
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O sujeito barrado, o sujeito que fala, escreve, pensa com imagens e palavras, está em constante relação com o tal objeto perdido. Essa relação que se chama fantasia. Mas olha só: a relação sugere o que ? Que uma coisa nunca vá se tornar outra, ou a equação some. A fantasia some. E se a fantasia não some é porque, novamente Stones, não existe satisfação.
Nunca haverá mais. Só houve uma vez. Melhor seria se nunca tivesse ocorrido, então a palavra "esperança" não existiria, simples assim. Grande sacanagem aquela primeira mamada. Enorme trairagem da natureza. Mas se não tívessemos mamado, estaríamos mortos. Pois é. Aí que começo a rir até meus bagos virarem vaga-lumes: A vida viva é uma tremenda escrotidão. No dia em que inventarem a retirada desse câncer chamado fantasia, sou o zerinho na pesquisa.
Mas sobra outra questão: se há um relacionamento entre $ e "a", isso ocorre pois é possível transitar de $ até "a", o que podemos entender, mas também...de "a" até $.
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Coceira em todo lugar eu já vi. Menos essa até agora, como me dar um nome depois de agora, sempre ?
Há duas semanas a parede do meu quarto começou a coçar.
Acordei com sede e não era líquido que matava, acordei suado e estava frio em todo canto, acordei ao lado de uma mulher que nunca conheci e ela disse "que foi, meu grande amor?".
Comi a sede, queimei o suor e a pele, à mulher eu disse que a queria para todo sempre véu e amém, mas apenas se ela se submetesse a alguns meus caprichos particulares. Fugiu pela janela do apartamento, sem olhar para a frente.
E não era nada disso.
Vi a parede e ela coçava em mim.
Branca, o concreto aparecendo pela rachadura em forma de mapa-mundi por descobrir, era naquele rasgo que eu coçava-me outro. Prurido que não era dentro, que não era fora.
Era no espaço entre eu e a parede. Branca e fixa, pois é.
Minha avó falava antes de perder os dentes: "Comer e coçar é só começar".
Prurido coisa boa: quanto mais eu enfiava as unhas na parede, mais a coisa ficava êxtase por fração de mínimo, de um bom ótimo além tanto tanto que vai pra lá da palavra e vive em um abismo entre meu umbigo e o primeiro átomo que deve existir logo após a parede, o primeiro pedaço de ar, a primeira instância da amputação do espaço que reconheço como meu, como eu, imagino. Que mundo explosão sem esforço.
Sim, eu tentei. Saí correndo, tomei o elevador, peguei a rua, saltos na corrida. Mas. Mas sei lá o quão longe, o bastante para que, fora da minha vista, dos meus dedos, da minha língua lambida nos inocentes cupins, paradoxo em cada olho chorando, eu sentisse a parede do apartamento me enlouquecendo de coceira lá nela e apenas nela em mim. Vomitei nos estrados das ruas e carros acamados de tanta movimentação, e minha última janta tinha o gosto que teria a palavra que falta aos amores todos antes do começo. Voltei deliciosamente, ou seja: em um misto de angústia e certeza de satisfação.
Cavei o buracio na parede, no tempo em que estava livre de atender campainha, telefone, e-mails demandosos. Me encaxei nele, não sou pequeno, o tamanho fiz exato, sem o saber, no entanto. Nem aquele átomo exultante de sobra e falta. Não tenho mais como despencar para dentro ou tropeçar para fora. Estou preso. A bomba amarrada às minhas coxas vai explodir em três minutos. Com os dentes gemidos ares, trago os ponteiros do relógio anexado sempre ao três minutos. Toda vez que faltam apenas três segundos.
"A vida, saiba, precisa de um sentido para se viver". Como diria minha mãe, enterrando os dentes da avó na quente terra ao sol, lá do quintal confortável que não mais existe em nenhuma memória, nem jamais existiu.
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Baudrillard vai fornecer a melhor interpretação dessa rota de fuga, do objeto "a" até o sujeito barrado. Não sei se Baudrillard sabe disso, mas eu sei. Quando ele diz que os objetos se vingam, finalmente de nós. Apenas acho que ele deixa algo atemporal como sendo contemporâneo. A vingança do objeto sempre existiu. Vejamos a lei da ação-reação, mas sem ingenuidade. Batemos em um objeto e ele devolve a pancada. Mas o que nos fez escolher aquele objeto para nosso soco ? Apenas a proximidade ? Não sabemos a razão.
Não saber é que algo escapa da nossa capacidade de significar.
O que escapa ? O que não pode ser dito, o que é a materialidade da linguagem. Lacan chama também o objeto "a" de "materialidade da linguagem", ou letra.
Isso mesmo: achamos que escolhemos, mas quem nos escolhe, de uma forma misteriosa, ancestral, visceral na coisa, é o objeto.
Quando o objeto nos ataca ( $ <-- a ), somos nós os objetos: somos o absurdo. O vácuo sem fim de um objeto besta atacando e sendo atacado por outros objetos ridículos para todo sempre, geração a geração.
A análise calma da equação fantasiosa nos prova, assim: Não existe essa ficção chamada sujeito. Não existe eu.
Não existe você.
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Ops...o barco está afundando em direção ao céu. Alguém me passe apenas o filtro molhado de um cigarro ?
°
"Esta linguagem é pura. No meio está uma fogueira
e a eternidade das mãos
Esta linguagem é colocada e extrema e cobre, com suas
lâmpadas, todas as coisas.
As coisas que são uma só no plural dos nomes".
(Herberto Helder)
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segunda-feira, 16 de julho de 2007

Listinha Pela Não Edificação.


Muito bem. Fiquei sabendo há pouco sobre umas listinhas que estão acontecendo por aí, ( aí = mundo dos insinuantes e petulantes blogs literários, entre os quais introduzo o meu com ou sem trocadilhos) um jogo de montar listas dos livros que mais colocaram fogo nas cabeças dos escritores. Cinco livros, cinco escritores por blog. Isso mesmo, a idéia é a mesma da corrente, quebrou cai um dente.
Aqui, nesse jogo, não sei o que acontece no caso de quebra. O escritor nunca mais vai conseguir publicar um livro? Pode ser. O que em um bom número de casos, seria uma benção dos céus. Mas como quem escreve está meio que pouco se fudendo pros céus, eu me vejo diante de uma grande indiferença quanto às regras: Quais os meus 5 livros prediletos, canônicos ( Sacaneei, Harold Bloom !) , de toda minha inútil vida ?
O escritor, antes de mais nada, tem duas profissões no mínimo: a primeira delas é ser obrigatoriamente um leitor. Não existe escritor que se preze que não leia. E ler é verbo amplo, passeia pelos clássicos ( mesmo se for para se engessar um pouco, conter ímpetos) e pelos contemporâneos ( mesmo que seja para dar uma rebolada tediosa em algum boteco da Vila Madalena), e faz de tudo para transformar contemporâneos em clássicos.
Dessa forma, como eleger apenas cinco ? Método : jogando pra cima. Pode ser. Eu peguei alguns que penso contribuir para quem vem aqui. Livros essencias, que eu me sinto a ala vontè para resenhar, e cuja leitura tenha uma boa dose de prazer, mais que de obrigação. Nem todos aqui são escritores, nem todos são obrigados a ler o que nós somos.
Resenhar no jogo que apresento, por convite-maldição de JEAN CANESQUI (http://aoficinadodiabo.blogspot.com), que por sua vez foi forçado por ALEXANDRE HEREDIA, significa brincar com os textos. Não estou escrevendo para Veja. Nem para a EntreLivros, que meus netos me perdoem pelaquela triste vez. Vou falar o que bem entendo sobre os cinco escolhidos a dedo com esmo. Do jeito que eu quiser. Com o tesão que me deram, nos aspectos que me gritaram em ressonância com meu espelho.
A gente se espelha. Autores, outras histórias, mitos, lendas, maneiras de se relacionar e de morrer. As grandes histórias já foram contadas e não são muitas, na verdade, menos que cinco. Bem menos. O resto é variação, simulacro, alegoria e alguma safadeza mais ou menos esperta.
Os meus 5 livros estão fotografados por mim, aí acima, sobre um cobertor. Hoje chove aqui e faz frio. É para esse ambiente de calor que quero trazer essas histórias( optei apenas por romances, já que não vi, nos outros dois caras, ensaio, poesia, filosofia, física quântica ou atlas geográfico...não sou eu que vou quebrar muitas regras de tão literata corrente), essas frases, essas letras e quem por ventura pintar aqui durante o tempo de permanência do atual post. Aconchego, paixão por esses autores. E pelos leitores que venham a se apaixonar também por eles.
No fim da minha lista ( chamada no jogo de Meme) invocarei o nome de 5 escritores que tenham blog, para continuarem o Big Brother Acadêmico Diletante. Confiram, sigam, acompanhem. Obviamente, vou privilegiar amigos. Quero cuidar bem dos meus livros: que tenham boa vizinhança é o mínimo pelo que posso lutar.
Ok. Vamos aos atores principais e seus atos:
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1) Um Copo de Cólera - Raduan Nassar.
Raduan foi um grande escritor, apesar de ainda estar vivo. Uma personagem minha ganhou seu nome. Ele não é mais um escritor. Parou com tudo e virou Rimbaud bucólico. É o único autor brasileiro da minha lista, o que deve servir para mostrar o grau de meu otimismo ufânico. "O Copo" é seu livro mais fininho. Quase escolar de férias. Mas é um impacto sobre a maneira como até então foi descrita relação amorosa. Homem e Mulher. Uma chácara. Sozinhos por dias. Eles se amam, eles sentem tesão um no outro. E muita, mas muita raiva. A raiva que só o amor faz suportar para esquentar o ventre. Raduan descreve de forma a causar asma satírica no leitor. Falta ar, chia o peito e ainda endurece a pica. Teve o filme do mesmo nome, fez um certo furor: o casalzinho lá parece que trepa mesmo na frente da lente. Mas que nada, sai da minha frente que eu quero passar e ficar bem bêbado infinitas leituras com o copo de cólera. Ou seja, nunca mais me apaixonei do mesmo jeito. Quem viveu sabe e a delagacia da mulher também.
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2) Trópico de Capricórnio - Henry Miller.
Falar de um livro de Henry Miller é falar de todos dele. O único autor em que eu perdoei a mesmice. Ele é o si mesmo de cada linha. Que porra de eu-lírico o cacete. Que meio história autobiográfica, se melhorando nos azeites. Ele não: fazia questão de se piorar. O que não pensem os incautos, fazia dele um imoral. O homem que se condena em público é o mais moralista de todos. Um dia, pra quem não entendeu, eu explico. Tanto faz se de Capricórnio, Câncer, Sexus, Plexus, Nexus, Primavera Negra, tudo a mesma merda maravilhosa. O escritor que não desiste de ser ele mesmo. E de ser escritor. De amar as mulheres. Magoar as mesmas. Subir aos céus com os amigos ( Miller, como disse Érica Jung, antes de um pornógrafo, é um místico). E trair, na próxima página, os mesmos amigos. Como, sendo tão inseto, o humano é ainda o maior barato que existe ? Miller prova. Eu tive problemas com a bebida na época em que o li. Eu achei que vivia entre Paris e Nova York. Eu mandei minha mulher mudar de nome. Eu mudei de nome. Eu recomendo essa danação.
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3) Almoço Nu - William Burroughs.
Muitos erram sobre Burroghs e sobre a "Geração Beat". Foram autores muito diferentes entre si, com livros muito heterogêneos no mesmo autor. Mas talvez "Naked Lunch" seja o único imortal. E isso não é pouco. Raros livros escapam de uma tarja, de uma etiqueta, rótulo como vocês dizem. Burroughs escapou. E olha aqui, não há um escritor de hoje que não cobie em alguma muita coisa esse sacana. Mesmo que nunca tenha lido o mais infernal dos almoços. William, após matar a sua mulher acidentalmente ( ? - uma brincadeira [ ??? ] de Guillherme Tell com uma automática) escreveu isso aí. Drogas, barra pesada, homossexualismo, criação literária, espionagem, poesia, jazz, viagem para Tânger, surrealismo único, etc e mais alguns etcs. Como coube isso tudo em único livro e mesmo assim, manteve a pegada, se fez paradigma literário ? Pois é. Como diz a EmeTeVê, é por isso que "Almoço Nu" ocupa a nossa sei lá que posição. Para quem tá sem saco de ler, vale tanto quanto o filme baseado na obra, do David Cronemberg. Quem for esperto, injeta o livro e dá o bunda pro filme. Gozão.
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4) Viagem Ao Fim Da Noite - Louis Ferdinand Cèline.
O melhor escritor de língua francesa de todos os tempos e acabou. Fim de papo. Quem ? Proust ? Mallarmè ? Baudelaire ? Que nada. Cèline. E esse é o seu melhor livro. O que pegou que ninguém conhece o sujeito. Ueba, essa parte é boa. Ele foi o maior escritor anti-semita da história do nazismo. Sim, os próprios nazistas ficavam assustados com seus panfletos contra os judeus. Isso me soa engraçado. Os próprios nazistas. Se para você soa assustador, relax. No "Viagem" não há essa pregação. É literatura em sua máxima potência. Um homem que do nada ( mesmo, sem chances ao psicologismo) resolve virar soldado e ir pra guerra, nesse caso, a Primeira, sem acreditar em porra nenhuma. Não é um romance histórico, nem fudendo. É menos histórico que A Divina Comédia, só que Cèline escrevia bem melhor que o Dante. Corrosão, sobrevivência e colhões de aço. É com ele mesmo.
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5) 120 Dias de Sodoma - Marquês de Sade.
Todos acima são filhos desse livro. Aliás, todos nós, homens, mulheres, bestas, bancários, menopausadas, escrotos, psicanalistas, enfim, a corja humana toda é filha de Sade. Um livro que se passa em 120 dias. E pra que tanto ? "Ulisses" de James Joyce é apenas um dia e por isso mesmo é genial ! Tá, ok. Mas Joyce não seria capaz de enumerar, profetizar, literalmente mesmo esporrar, cagar, mijar, assassinar em cima de cada uma das todas taras humanas. Pensei em todas que já cometi, as que tenho vontade, as que tenho nojo, as que nunca pensei até então. Pois é. Estão todas lá. Quando o Marquês escreveu a história de nossos "heróis" libertinos, estava preso na então Bastilha. Na confusão revolucionaria e punitiva, achou que o livro tivesse sido perdido para sempre. E assim, todos os seus livros seguintes foram reflexos melancólicos de "120". Mas não se perderam. Foram bem escondidinhos. Livro mais maldito nunca houve e nunca haverá. Por isso sumiu. Na ascendência do modernismo europeu, uns doidos fizeram a coisa vir à tona. Ninguém mais sobre a Terra, mesmo que não leia, poderá ser salvo. Que bom. Mais divertido assim.
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Isso aí.
Agora, vamos as nomes dos próximos no joguinho.
Deixe-me escolher...
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ESCOLHIDOS ( Favor segui-lôs, são ótimos para o fim proposto) :
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Carol Custódio : http://naselva.com/carol
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quarta-feira, 11 de julho de 2007

Simone e o amor.


(foto: Paulo Castro )

Mais que um ato, o gesto. Mais que o repouso, um abandono. Simone espera que eu conte sobre os "melhores anos" de sua mãe, aqueles em que interrompe a feitura do mais cotidiano dos diários, com a derradeira anotação: "Acho que amanhã vou conhecer o homem da minha vida". Nesses anos em que Simone estudara em Roma, com o mesmo tom de farsa que agora, no encontro, está ausente. Daqueles tempos em que sua mãe desaparecera, ao que tudo indica, por causa de "outro homem", que não seu pai.
Já adulta- e bonita, alta, delgada, feita de ângulos de captação do meu olhar( ponho e pus a culpa na imagem fora de mim, não cedendo à ânsia do suor, nas mãos e pés, sapato apertado que lateja, dedos sem anéis que garroteiam uns aos outros : devo parecer o que sou, antepassado), sentada diante de mim naquele restaurante em que almoçam todos os viajantes da estrada tumultuosa. Já grandinha - e tinha olhos e lábios, deste modo - para entender que certas escolhas acaloradas da vida é que definem as vírgulas de um sintético epitáfio.
Mas desafia-me, Simone, a preencher com o que eu teria para contar, nada menos que o verbo lapidar. Tento segurar a pompa dentro do peito insuflado: veja isso, Simone, que palavra é essa, veja que adjetivo, diante da humanidade que você me obriga, lapidar. Quem sabe verbo, se eu pudesse requerer uma biografia da minha intimidade obscura.
"Tem aí alguma fotografia daquela época?" - reinado de seu cigarro assoprado e disperso no ventilador de teto.
"Umas memórias, pretensões passadas, eu acho".
"Conte o que lembra, mesmo que trema desse jeito."
"Um cigarro...do teu?".
O diálogo é um vício ao qual nunca me entreguei. Mesmo a mãe de Simone ficava perplexa com a maneira com que eu resistia à sonoridade de significar alguma coisa, dessas de restaurantes e estradas ainda sem objetivo. Mas terá sido como a vida de Simone em Roma? Quantos amantes? De que forma desenvolvera esse ar de hostilidade na carne? Resisto, segurando na pompa, a fumaça cinzenta. E cruzando na altura de minha boca, erosão e secura, tensas, lacradas.
Porém, sinto que se eu não disser nada, nada oferecer, um resto de significado cuspido pela garganta, ela pode mais que apenas fugir, Simone, fugir de mim:
"Que milagre, as páginas amarelas, pensar que você me achou e que...".
"Quero folhear agora as páginas amareladas".
Não sei que gatilho foi disparado bem no frio da barriga, mas explodiu em gargalhada, dessas sem explicação nem causa, sem galho ou laço. Uma daquelas risadas tossidas, de modo que em lágrimas, Simone se desfaz em curvas fechadas, luminares, na minha frente. Que até me falte o ar, assim respiro aliviado em algum outro lugar interno, mas não suma, Simone. Até que vem a batida grave e repetida nas costas, o garçom me salva do que, com certeza, interpretou ser um engasgo fatal. Aponto as azeitonas empapadas em óleo, intocadas entre eu e ela, como se com isso, explicasse tudo, a geração do universo, das espécies, infâmia e traição. Azeitonas roxas. Que no entando, nada têm a dizer sobre a mãe do inquérito.
Vendo que estendo a mão por tempo demais, teatral indignação, o pires já nem mais ali na mesa, recolho-me em braços cruzados e coriza. Mais ainda, me abraço e enfio os dedos nas omoplatas que eu não me sabia tão curvas0. Se não estivesse com algo como febre, eu estaria muito sozinho com Simone.
"Você está bem?".
"Acho que não tenho nenhum atestado para me salvar dessa vez, sabe, a loucura, quem dera ser expatriado, colocado em caixa de papelão, nos arrebaldes da cidade, fechado e lacrado com fita grossa, até que perdesse - veja bem - não a esperança, mas o receio em ser encontrado. E se algum viajante exaltado de caos resolvesse ali enfiar sua faca, quem poderia me condenar se eu tivesse outro ataque de riso, como esse de agora mesmo ?"
Apesar do meu empenho, Simone não riu da piada. Saiu do seu abandono e gesto de ser angulosa, lisa, de uma irritação dissimulada em compassividade, apoiando os cotevelos na mesa, quase pronta a morder, ágil em não haver mais distância entre eu e sua seriedade bonita, assustadora, prenúncio de que entrava em embates dos quais saia apenas um para contar a história. Uma constatação confirmada da suspeita. E assombrosa. De todo modo, eu poderia lamber a sua testa nesse momento, enquanto ainda estávamos a dois, vivos. E finalmente, o restaurante na beira do nada voltou a fazer barulho de existir, mesmo o mundo, os carros e ônibus estacionados lá fora, a menina que chorava: leva tapa na cabeça mas não larga da mãozinha o molho confuso e magnético de coloridas fitas de Nossa Senhora Aparecida.
"Eu realmente quero saber da minha mãe. Não pense que foi fácil achar você".
Ela desejava mesmo entrar no mérito da dança. Que fôssemos. Eu, do meu lado, já não tinha lá muito o que temer, nem ao menos a piedade, amor à vida, como dizem os que andam nos acostamentos de mais além. Tirei os pés dos sapatos, sem reticências, no chão frio da vontade de avançar:
"Simone. Ouça, Simone. Tudo que ela foi, é você. Idênticas aos meus olhos. Mesmos gestos, além da petulância desrespeitosa. E já que é tudo isso, me deixe então falar. Sobre o amor. O amor, Simone. E o susto que daí sempre decorre, Simone. E você, suponho que aceite. Uma nova e repetida aventura, de certo..."
Agora não tem mais o que achar ou supor. Eu tentei lhe proteger, até obssessivamente, Simone. Minha Simone. Agora. Minha.
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quarta-feira, 4 de julho de 2007

Pop Curtinhas.




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Fui numa festa já faz um tempo, em que havia um nenem e muita gente louca.
Os pais estavam pisando no teto, e eu na falta do que fazer, fui ver aquilo: os vinis.
Esse povinho chapado sempre tem vinis.
Agora resolveram que querem ter filhos e conta no banco.
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Fico muito preocupado com o destino do rock and roll nacional.
Claro que existe uma exceção: o rockinho gaúcho.
Como tudo que vem lá do sul, a coisa é bem bacana.
Tipos como Frank Jorge, Graforréia e principalmente o Júpiter Maçã.
Aqui, todas as citações serão de demos do Júpiter.
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"Me faz sorrir...me faz gozar
Eu vi a minha namorada saindo do banheiro com mais três caras
mas sim, ela sabe o que faz"
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Outras festas, do tempo da faculdade, a gente tomava vinho e dançava as músicas mais óbvias.
E esquecia que fazia a tal da faculdade.
°
"Quando você der pra outro cara,
Lembre-se que alguém se masturba
Alguém do outro lado da cidade
Se sente em sintonia e pensa em você
Estou ligado na sua
Essência interior"
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Eu tenho uma filha e comprei um mp4 para ela de aniversário.
Nos aniversários dela, desde o nascimento,
existe Fanta, Coca-Cola, Bolo de Chocolate e um de morango que é um arraso.
Ela ouve rock and roll no mp4 e eu fico orgulhoso.
Como bom pai, fuço no mp4 dela, pra ver se não há lixo.
Ainda bem que não encontro nenhuma faixa do Cd. MTV ao vivo 5 bandas.
Frenso, Hateen, For-Fun, NX-Zero e Moptop.
É uma coleção do que há de pior.
As rimas são feitas de gerúndios compulsivos.
A última faixa, é "O Rock acabou?".
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Ah, músicas originais de Júpiter Maçã, pra acabarmos com as mistificações paulistas-baianas.
Miss Lexotan 6 mg não é do Ira!
É dele.
E principalmente:
"Lugar do Caralho" não é do Wander Wildner ( poderia ser), e nem fudendo que é do imbecil Raul Seixas, aquela trolha que usurpou a barba de Tostói.
Tenho ambas as faixas originais aqui.
Quizendo,
é só pedir.
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Pra quem quiser encarar umas de saber quem foi Tostói, não precisa encarar Guerra e Paz ou Anna Karenina. Seria o aconselhável, mas hoje é só de curtinhas pop.
Comprem a edição "O diabo e outras histórias", da Cosac & Naif, a editora mais fodona do brasil brasileiro.
O cara come uma camponesa, depois se casa com uma burguesinha meio frígida, mas não consegue esquecer a mina que ele traçava nos bosques e atrás dos casebres. Acaba metendo um balaço na cabeça. E tem final alternativo! Ele mete um balaço na camponesa safada !
Esse é o tio Leão, Leão Tostói. Como se fosse hoje, comigo ou com você.
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Tenho saudades de uma pá de coisa na vida, mais coisa que gente, mas do meu programa de rádio "Leite Condensado" na Unicamp, o peito aperta. Lá a gente bebia vinho e colocava e cantava músicas estranhas.
- Alô, alô, garotas da moradia estudantil...aqui é a turma do Leite Condensado...nos tragam uma pizza e ganhem um esporro na boca, entre os dentes...
°
"Orgasmo Legal
Orgasmo Legal
é isso que ela me dá...
Ela me dá orgasmos legais que deixam meus dias legais...
Nuvens carregadas não me assustam não mais.
Crises de mau humor não me incomodam
Orgasmo Legal é o que ela me dá.
Eu me dedico de coração pra dar a ela
orgasmos e tesão !
Por isso é horrível quando a gente discute,
vai pra cama sem gozar!"
°
O rock tem que ter algo de bobagento, inteiro mequetrefe, pra ser bacana.
E deve-se manter nesse limite entre a tosqueira simpática e sorridente ( dente cinza)
e a estupidez de rimar gerúndios.
Ou a chatice de rock cabeça.
Rock cabeça é a anti-foda.
Saca Morrisey, o pai dos emos ?

Me diz se não é música de gente que não fode ?

Tipos: Com algum defeito que não encara superar.
Então.
Música pop é pizza com catchup pra se comer assim mesmo, com cuspes e guitarrinha de fodelança sacana. Sala Especial. Saudades da Record 1980, totalmente profana e punhetária.
°
"Uma bruxa tipo mariposa
Minha melhor amiga morreu do meu lado,
ao lado da minha cama,
a bruxa mariposa..."
°
É como escrever em blog.
Quem pensa em escrever verdadeira poesia aqui ?
Sejamos sinceros.
Isso aqui é consumo puro.
Vem a putinha e diz: Paulo, você está fraco.
Tá esperando o que, lacráia ?
°
O que significa J. deep e K. richards abraçados na capa da Rolling Stone ?
Caralho, o que eu acabo de falar.
Os dois são ótimos e gatos, as artroses de richards me excitam, Deep é tão profundo como o Conde de Rochester, e sexual como tal.
Mas ganharam uma grana sadia bebendo, queimando e rindo nos Piratas do Caribe.
Errados ? Rasos ? Capitalistas ?
O filme é um barato.
Chato é você.
E vamos com mais Júpiter Maçã:
°
"Eu deveria me converter ao hinduísmo
Comida vegetariana
Mantras e Krishinas
(...)
Queria cantar como o Beatle George:
Aleluia Hare Krishana, Aleluia !"
°


Depois veio o babaca do Nando Reis e fez algo sério parecido com isso.
Gravou a filha dele correndo no meio daqueles carecas do mal.
Eu faria uso do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Aposto que ele não controla a desqualidade do que rola no mp4 da Zoé.
°

Tenho medo do futuro das nossas crianças.
Ou sérias, do tipo que casam com caras chatos, médicos assumidos, advogados, engenheiros, e não sabem rir de uma boa bobagem,
Ou dementes emocionais, que choram quando sentem a culpada vontade de dar risada.
A música emo é uma criação de laboratórios farmacêuticos.
Indústria anti-depressiva.
°

"Preciso andar com vocês...
Tomar um sorvete com vocês...
Preciso saber do Brasil...
E da gente linda lá do Rio...
Pois todo compositor contemporâneo
Precisa conhecer molécula de urânio.
Todo compositor contemporâneo".

°

Além do programa do Leite Condensado, a gente tinha a banda de rock homônima.
Na última música, sempre eu fazia um "perfomaço", me masturbando com uma lata de Moça.
E daí aquilo voava no público e a diversão estava garantida.
Nada mais patético, isso deve fazer você torcer o nariz, mas se como eu, tivesse vivido isso, hoje não ameaçaria ser assim tão pé no saco, meu chapa.
°

Pobre filho, cujo pai nunca vomitou abraçado na privada do bar.
Pobre esposa, cujo marido gosta de suas bochechas gordinhas bem perfumadas e machas. Se acha homem, mas usa pijama de botão marfim.

Pobre sujeito que não acha isso tudo divertido, leve, suave como uma foda perfeita.

Aliás: o melhor lançamento musical dos últimos tempos: A música daquela propaganda de carro: "Não tem cara de tiozão". Ver no meu perfil do Orkut. Depois vem o acústico do Lobão.

A melhor e mais barata sobremesa do pedaço: o pastelzinho de Belém do Habibs. Tô brincando não. A parada é de massa folhada real e tal.


E sempre, infinitamente ( antes da Marisa Monte ) , o rockinho gaúcho.

°

Aos cools : A trilha sonora da série Nip Tuck. Aliás, só ali os médicos são gente divertida afudê. A vesão de "Fever" me traz polução diurna, noturna, sem contato manual.

°

"Eu só fodo com você
Nessa fase atual da minha vida
(...)
E quando eu te visito pra
Tomar um chá
E a gente começa a falar
Tudo fica claro na minha mente
E a gente começa a trepar."

°

domingo, 1 de julho de 2007

Fragmentos Sem Direito à Indenização.


Folhando a "Veja São Paulo", vejo um elegante chef de cusine com algo parecido a um lança-chamas na mão. A imagem chama minha atenção e vou procurar o nome do sujeito e o restaurante. A linguagem escrita tem dessas coisas, e por isso, devemos sempre ler com toda atenção aos textos mais medíocres, eles que guardam os sintomas da nossa decadência.
O nome do cara era Douglas. E o sobrenome, tinha três sílabas separadas. Der Van Ley. Parece algo chique, como o nome do diretor cult Gus Van Sant. Mas se você atendar à ordem das sílabas, verifica-se a lógica:
1ª) Van
2ª) Der
3ª) Ley.
Ou que dá a sonoridade: Wanderlei. Douglas Wanderlei. O sujeito fez isso com o próprio nome, por ser chef de cusine maçarico na mão. Será coincidência que o nome do bistrô seja "Recife".
Todo texto deve ser submetido a uma implicação preconceituosa, ou seremos ingênuos como os seres mais puros do sistema mental conhecido, os autistas.
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No meu último texto encontrei algumas resistências. É só ler nos comentários. Certo que algumas não foram comentadas abertamente, mas suspiradas pelos cantos esperançosos do universo, frustrados: O Paulo voltou a escrever putaria, ai meu Deus, ele não se converteu ainda?
De um lado, a moça que foi e voltou algumas vezes e disse que não iria mais colocar mortadela no meu sanduíche. A tal da Val dita. Ela comparou meu texto com uma punheta, como se isso fosse algo negativo. Oras, todo texto que se preza é uma punheta. Sem a ilusão de que é uma "transa entre escritor e leitor". O leitor é um bicho parasitário, ele se apropria do texto para o próprio gozinho. Sei por ler, escrever e seguir a evolução sexual dos olhos. Os livros são os substitutos fora do banheiro das revistas de sacanagem, um fetiche como qualquer outro. Não fosse assim, as mocinhas não teriam berrado de tesão ao redor do castelo de Rilke. Nem a confusão entre narrador, eu-lírico, próprio escriba, seus desejos, opiniões e estética causaria tanta rusga entre os casais minimamente intelectualizados. Se para o Flaubert, Madame Bovary c'est moi, para Val dita, Madame Bovary é uma puta cheia de pompa e metida à besta, exibicionista da beleza construída com engenho. Quem mandou ser tão interessante, quem mandou ter os pães abertos a receber as fatias de pastrame ? A vulgaridade vem sob a forma de uma mortadela negada, ou um prato do "Recife", vindo diretamente das mãos do chef Wan Der Ley.
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Outro mandou eu, antes de falar ou escrever bobagens, pegar no meu pau e chupar. Pois bem. Esse outro ou outra é alguém anônimo. Não vou gastar aqui meu pequeno e monoprodutor pau para questionar a coragem e a covardia de quem comenta de maneira anônima. Outros menos capazes fazem isso por mim. São mais pauzudos. Dito isso, existem apenas duas possibilidades, ou não tenho uma costela, como o Adão ou Marylin Manson, ou tenho um caralho gigantesco. Com nenhuma dessas coisas é verdade, muito pelo contrárias, não existe nada em fundamento na crítica, o que faz com que ela tenha o mesmo valor de um rap raivoso. Nulidade. Isso sim que é mortadela. Eu agradeço e guardo para os dias de necessidade.
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Em um mundo de "O Segredo" e "A menina que roubava livros" ( prende, porra!), achei "Frutos da Terra", o melhor livro de André Gide por 17,00 reais.
Não há do que reclamar em uma época medíocre como a nossa. Mesmo o prazer da busca é maior, a tonalidade de "raro" ganha seu delicioso aspecto burguês, o mesmo que justifica as tardes passadas no shopping center. O "achado" é o único prazer do intelectual. Prazer idiota, narcisista, clubinho de vernissages não disputadas. Que a mediocridade impere. Meu bolso agradece.
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Em "Frutos da Terra", Gide faz seus heróis mergulharem em encontros, sabores, vinhos, bosques, fodas, e poemas, com a única intenção de trazer nobreza à volúpia, papel maior da literatura, calando assim as bocas mais beatas que um dia ousaram pedir um livro de Natal, e com isso, ousaram emitir opiniões sobre as coisas. Ou seja, as Val Ditas da vida. Gide descreve os prazeres da sodomia de forma mais "espiritual" que todo um hinário litúrgico. Essa é a perversão que a arte domina, faz gargalhar e cospe com elegância no bueiro dos batismos no Tédio. Por 17,00 reais. Um prato do Van Der Ley custa R$ 210,00. No Recife, São Paulo. Ainda prefiro outro nome bonito, Win Wanders. No Paris, Texas.
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Se grande parte da literatura foi criada por homens, caso tivêssemos a capacidade de chupar nosso próprio pau, a punheta oroboro, o sagrado matrimônio com que mais amamos, a configuração da arte hoje seria outra. Madame Bovary estaria entediada não por um casamento morno, mas por uma luxúria cansativa, por um tratamemento crônico com o coquetel anti-HIV.
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O grande risco das alianças é que você limita em muito seus potenciais objetos de riso e infâmia.
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Mesmo que você limite sua vida ao mundo internético, ainda assim, tem como julgar seu valor intrínsico. Fiquei muito feliz em estudar a listagem das pessoas que me bloquearam no Orkut e no MSN. Um estudo ético-estético dessa trupe triplicou minha auto-estima. Tente você também. Claro que por sua conta e risco.
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Procurei o Douglas Van Der Ley no Orkut. Não achei. Gente chique não se mistura, ou só aparece em foto sorrindo de nada, para nada, sem nada. Algo como o "salve simpatia" a priori, que, pensam os marotos, guarda toda a sedução e gatice. Sou, antes de tudo, um bronco.
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Preciso ver se a Val Dita me bloqueou. Torço que sim.
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Ainda da "Veja São Paulo": capa: esposa do Serra. Ela é bailarina, psicóloga e...ONGUEIRA. Isso mesmo. Ongueira. De Ong. Depois atazanam os punheteiros, classe bem mais legítima, producente e cultural. Ouvi falar pela primeira vez da primeira-dama do estado através do departamento de Psiquiatria da Unicamp. O Serra queria que sua esposa virasse, do nada, docente da faculdade. Ok, pode ser, o que ela tem a oferecer? Bem...ela é especialista em ensinar ballet para pacientes psicóticos.
Daí o govarnador não ter dado plena razão aos baderneiros inúteis da USP é algo incompreensível.
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Será que o "Recife" tem serviço de Delivery ? Vou perguntar ao Motoboy que comentou meu último texto. Anonimamente.
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O grande problema em se fazer alianças é que você amplia em muito seus motivos para preguiça e tédio.
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E como diz minha amiga Carol "red fox" Custódio: "Porra, Que Chique!"
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Uma semana cheia dessa porra para vocês.
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domingo, 24 de junho de 2007

O ódio é uma virtude.


" no espelho
não vejo
meu guarda-costas"
( marcos prado)

Coloco minha língua de serpente bifurcada pra fora,

ela pega no enxofre

sua família, seus ideais, suas virtudes e tudo isso é apenas o que segrega o clítoris oblongo,

da sua coisinha resguardada, que gosto bom, o sonho, melhor-à-me o real,

na festa do dia das mães, eu estou te olhando e sei bem e você sabe bem, quando lambo o sorvete,

e em apenas uma única linguada, todo corante, acidulante, verdejante, pingam na cabeça daquela criança negra imbecil judaica pequena homossexual, ou apenas corretamente familiar,

que é um verdadeiro muro de bosta entre meu caralho e sua cona.

Não tenho mais saco nem idade pras meias-palavras. Salva-vidas idem.

Você disse que não tem medo, que eu sou o medo, então prove isso e estarei esperando com o mastro duro entre as mãos de calo e manicômio, sem dar explicações para esse mordomo-fantasma que sempre passa as notícias da sua vulgaridade amorosa para mamãe-papai-marido-consciência...

...afinal, o que é uma trepada perto da crise de moral ?

Nada.

Você que não pensa.

Mas se eu colher flores e escolher bombons da ilusória árvore de cacau amarradinho e disser que vamos fazer amor,

você relaxa;

eu não relaxo,

eu ganho minha ninharia por hora, você me diz que não tenho tempo, ( então pague minhas férias de te foder ),

e eu completo: não tenho tempo a perder.

Se houver algo diferente do orgasmo e poesia,

no que você me oferece,

eu apenas meto uma bala na minha cabeça cabelo, sua cabeça espelho

e hoje, saiba, estou exausto,

e estar exausto, no meu contexto,

é o mesmo que estar pronto para explodir tudo, TUDO,

sua família, tua bondade de aceitar um ex-drogado no seio tetinha da sua buceta,

na bondade de seu sorrido e seu pouca-coisa com CIC fora do SERASA:

- Pode respirar por um tempo, Condenado, que eu deixo, a Lei deixa, a Psiquiatria( não uso nada, parei, não uso nada, padre, até quando suportar os olhares caixão, compaixão dos vizinhos e mesmo as relutâncias de quem diz me amar?) deixa...

Como não antever que isso uma hora vai cansar

e que um tipo petulante e criminoso como eu,

vai mesmo, sem dúvida, sem aviso prévio,

puxar o gatilho bem onde seu ovário

está cheio de durex's, e neles,

as fotos dos seus momentos mais fingidamente felizes, monumentos de mulherzinha certa ?

Explodo teu útero com a minha porra gosma engula Alacatraz,

( CHUPA-ME)

e nosso filho será apenas a

porta,

a Porta Capeta,

do Inferno:

sabosoro isso, Kid.

Goze como não goza desde que nasceu.

Sim, eu te explico a semântica de Sade, dos 12o dias de Sodoma,

para isso, apenas me obedeça,

Me obedeça a ti, Kid:

- Fique de quatro e abra essa bunda linda chanel 5 pra mim,

morda uma rosa espinhuda ( poemas fáceis do seu terceiro colegial...),

que agora eu vou entrar, mucosa, fodona,

invite me:

eternidade-sussuro ( " E agora, como vou lidar com a imbecilidade de minha-ninho vida?")

seu desespero suicida("Quero apenas isso para o resto da minha-ilha vida, eu me mataria pra viver assim, nesse quarto de hotel, chiaro-escuro, nesse frigobar, nesse autorama lá embaixo, mais de dez andares, formigas babacas de super-carangos, você sempre aposta alto na altura, nesse formigueiro em que meus antepassados e gente de respeito congelador coração e pica molenga vivem ?")

Estamos fudidos, baby.

Coleque uma moeda. Tire tua roupa de baixo, minha cueca,

Pra você pode ser uma coca light ECOLOGIA, ixe.

Pra mim: escolha outra garrafa d'ataúde de vinho pinguço :::::::>

Gozemos antes que a polícia menestrel-votos-quase-freira ( hipocrisia de vagina ourives delícia na boca minha) apareça, curso de noivos, você bem sabe a baba.

Ai, que tesão ! Amarro a uretra na tua chupada literatura da glande.

°

[ Para a Val e quem mais não gostar: PERDOA-ME POR TUA FRIGIDEZ ]

terça-feira, 12 de junho de 2007

Literatura de Gente Média.


Todo ninguém já escreveu tudo, cada vez mais difícil passar a fome, mata o homem e come, dizia minha avó, todo mundo já escreveu nada, a única pista de caça ao sabor dos dentes é a gula por essas manchas de baton deixadas nos postes, uma coreografia estática ou um mapa animado, a molecada queimando fumo na praça. Eu atrás dos fiapos de meia 100% qualquer coisa, mistura de tudo, a molecada tomando água mineral, o lençól freático contaminado, comungam hormônios-ectasy , as meninas que vão chegando, e que tem medo do amor, não usam meias, nem batons, apenas feridas espalhadas nos rostos, suas mães boiam mortas afogadas dentro de fundo mais oceano subsolo do lençol freático. O que não causa certa radicalide em buscar as próprias raízes.
O cheiro fica na minha roupa, o odor forte daquele cânhamo doce demais, a fé na lepra, a confiança da contaminação das agulhas, só não jorro tripas pois mesmo isso, todos tudos já escreveram, venderam livros, fizeram doutorado. E
Escrever virou pequeno vício de all star, vodka e as torpezas que caracterizam as revistas de fofoca, é um mundo criminoso o das letras, os livros, os blogs, as bíblias sacanas, incluindo aí os mórmons do fetichismo alternativo , e gente que acha que...não é essa a questão, afinal, mas onde foram parar as manchas de batom ?
Sempre que me arrisco, vem a vida, sempre que me guardo, vem a escrita, mas que escrita, que vida se trata nesse tropeçar sem ter bebido, sem estar desesperado, não quero te amar nem que seja um pouco, nada disso, não moro em uma quitinete, não passo ao pão e vinho, meu sapato não está furado, não sou voyeur, apenas regularmente curioso, tropeço pedras e arrebites por pura descompustura corporal, falta de jeito, atrapalhação, o que não me cora a face, vaidade não pra tanto, não é ainda madrugada, não passo fome, meus poemas não sofrem de sangue com gilete, meus amigos não são escritores, nem ao menos meus inimigos, e se tenho uns ou outros, é pela vida morna com lucros adicionais, não contrai tuberculose, dívidas de jogo, epilepsia russa, pelo pau nenhum bicho mortal.Nem sempre gosto de literatura marginal, tenho jeans rasgadas, das quais me arrependo dia ou outro, as pessoas me dão "bom dia", nem sempre me acham um bruto ou otário, as mulheres não me passam mais a perna do que eu passo nelas, nunca casei, nunca abracei os tornozelos ( ??) no banheiro por causa de solidão fingida, e assim sendo, acredito nas boas e más intenções das revistas semanais, bem como não vejo charme em tomar pingado de padaria, a não ser que queira muito o cigarro, essa maneira paralela de ver as coisas ouvindo rock inglês se o escritor tem até 25, de ver a molecada fumenta e sentir-se o papai luciferiano ouvindo jazz, se o anti-demiurgo sôfrego passou dos 30, e assim sendo até não ter a mínima curiosidade de andar pela rua seguindo manchas de batom, fiapos de meias, papel amassadinho de chocolate Bis. Gente bestiária que tiram a tesão quase católica de dementar em paz, reclusos em Cidades Grandes e Urbanóides, sem muita idéia das coisas que Ítalo Calvino fez Marco Polo falar: à quisa de aconselhamento, se for para fazer da metrólole, personagem, que ao menos, como fez o italiano boa-praça e sorridente, sem suicidecos( autores pitadinha de limão na cachaça[ tequila disfaçada] têm cara feia e a vaga noção clubber GLS do que pode ser um fim de noite, justificável apenas se uma mulher nua refletir a lua, vista do banheiro, enquanto rasteja o narrador oniausente), como Calvino teve a finura de ressaltar, que sejam Invisíveis, tais Cidades...
A caixa de Bis morre numa valeta, a mão da mãe da puta menina moleca pega e quer levar pra suas parceiras em histeria, lá dos lençóis freáticos que acumulam papéis. ( Minha maldição de cansaço literário deve vir daquela feita em que me limpei com várias páginas de "Plexus", não por condenar Miller, gosto dele um razoável tanto, mas por necessidade naquela praia deserta, aliás, bem pertinho de Paraty...). Piso a tempo na mão galhosa da velha que já deve ter comprado muito fanzine na década de 80, cabelo oxigenado, gel lantejolado, e há de recordar os tempos áureos das gafieiras no Madame Satã. A literatura de bolso ( um oferecimento LP & M editores ) me dá uma arma no bolso, algo como uma automática nazistóide está de bom tamanho, um sobretudo está em mim, roubei na alguma sessão de cine cult Unibanco, e assim, anasalado já que procurei por esse bocejo proseado:
- Velha, viu passar a moça de eternos batons ?
Ela goteja coisas meladas na garganta frenosa.
- Viu, porra ?
( A "porra" é oferecimento do pobre Paulo César Pereio, que mal consegue dar uma entrevista sem estar chapado...não é possível que eu me identifique heroicamente para com quem sinto compaixão...)
- Ah, foi pra lá ! Brains ! Brains ! ( um ofereciemento "A Noite dos Mortos Vivos", todo escritor desse naipe curte cultura pop trash hip hop hype e a mistura disso tudo em incompetência sintática...).
E joga o dedo em direção à rodoviária, saída leste, o dedo vai mesmo voando( um ofereciemento das piadas que tais autores gostam de piadar(neologismo lhes são caros) nos bares da Vila Madalena, adaptando musiquetas do Lulu Santos para fazer rir as moças de franjas emplastadas, algum lesbianismo cabeça e tattos, com curso MBA em Photoshop Aplicado ao Orkut, além de se divertirem nos últimos meses lá na baguncinha frenética e woodstoqueana da USP...) :
- "Já não tenho dedos pra contar de quantos barrancos despenquei, de quantas pedras me atiraram ou quantas atirei" !
- Ahahahah ( ou a variação: kkkkkkk, entre outras, como smiles e emotions), cara, você é muito ótimo e mesmo feio, simbora pra praça com a molecada, chame o bar inteiro, vamos achar uma maneira torpe de você construir à partir de mim mesma uma personagem que chupa câmeras digitais e caralhos emancipados por editoras alternativas...
Subo a entrada íngreme leste e apenas estou vestido sem mais nada de especial, calça de pano bege, camiseta branca - limpa - barba feita adequadamente.
Lá está o ônibus jogando fumaça como todo ônibus joga, sem com isso, criar nenhum clima que me faça lágrimas, ou pior, citações.
Subo.
Uso.
Frases.
Curtas.
Não.
Por.
Estilo.
Mas.
Por.
Folêgo.
Curto.
Lá está ela ao fundo, retocando o batom, amassando a meia, que enfia no cinzeiro redefinido em sua utilidade, não pela arte, mas por uma boa e velha lei de convivência entre as pessoas. Sem rebeldia na voz - nem fina nem grossa, muito menos rouca de charros e ressacas desidratadas- me pede:
- Tem um Bis ?
- Tenho fome também. Acho que podemos ligar pro disque-pizza, se você não se importar que esse frete nos leve para minha casa. Já disse: é ampla.
- Não. Nem te conheço, sei que vamos ficar juntos no final, mas antes de tudo, fico sem chocolate ou os quatro queijos, a que mais gosto, antes de tudo, antes que todos escrevam sobre a delícia da santa mediocridade, eu te digo cara, mounsier, como quiser, sinto que precisamos começar de onde os livros deveriam começar, bem como os filmes, mesmo os curtas de sexo, miséria e loucura, ou seja, do início.
- Acho mais que bom.Que tal um lanche da tarde amanhã? No centro ?
- O lugar é bacana ?
- Sim, é limpo e as garçonetes sorriem.
- É isso mesmo. Acho mais que ótimo. Você odeia Olavo Bilac, cara, sir ?
- Não. Ele pode ser útil. Como pode ser inútil. Todos são assim. Eu e você, inclusos.
- Feitíssimo, meu amigo, meu amante, futuro maridinho sem pratos quebrados de chilique estético.
- Posso mandar o motorista fazer o que deve ?
- Claro.
- Ô motô, leve eu menos ela, cada um pra sua casa. Amanhã acordo cedo e tenho que trabalhar, algo meio besta, meio legal, enfim, alguém precisa se preocupar com as contas e sorrir quando sobram alguns trocados pra ajudar alguém ou beber uma cervejinha. Toca a barca.
- Feito, chefia.
Aceleramos, obedecendo o limite de velocidade.
E assim, fecho os olhos, encosto e dou minha mão à dela.
Com a outra, passa batom, sinto cheiro cereja, sem borrar desesperinhos, como uma boa mulher gente grande.
Vamos nos dar bem e será divertido, sem pesar pro fígado.
Talvez escrevamos juntos. Ainda não somos ninguém e já deixamos todos sendo.
°

quinta-feira, 31 de maio de 2007

Publicidade e Mar Quente Ltda.


Chutando latas, assobiando, perdi o hábito, rasguei-me a seda e curti o arrepio na pele, um erotismo que o vento traz, chutando choros, botando a boca no mundo e chupando até a goela, beijando o pescoço das galinhas da vovó, assim vou indo, cantando alto tudo que for venéreo, todos os fios de cabelo que a tesoura das ruas me condena, amputação das sobracelhas, enforcamento do meu espelho, até não ser mais eu e os sete anos mergulhados no sangue sacrificial da não-plenitude.
Meninas e garotos horrendos em suas belezinhas em que a brilhantina vulgar escorre de seus possantes carros, o óleo diesel misturado com a Coca-Cola e piscam tanto uns para os outros que ficam tão cegos quanto o tétano.
Andando, chupando serpentes, chutando garotas e meninos, com todo poder do esquecimento.
Palpites enrustidos afundando na lama em que piso de coturno pré-militar. Sabe como ? Assistindo TV e pensando em outra coisa, fazendo outras coisas e sonhando com a Bem-Amada, a saber, minha televisçao, essa bissexual que faz algo quando saio, tenho certeza, tia, com o liquidificador e ainda pego a orgia com o agente principal de todas as paranóias modernas, afetivas, inseguras da própria umidade : o Personal-Computer deitado na rede, bem no meio, entre a mulher e o homem.
Andando e chupando acordos para sobreviver nesse mundo e saiba, saí pra compar cigarro e rum pro meu lindo hardware gostosão e latino.
A lama redondilha menor, a brilhantina redondilha média e os versos brancos sendo os principais para falar disso tudo, sem no entanto explicar como cicatrizam as feridas dos anjos amputados de suas asas, tendo que comparecer à vergonha de não poder cantar alegre, ouvir música alta, ou praticar um justo assalto, um karmico sequestro, um divino erro de cálculo renal, esse que enaltece pela dor a existência da bocarra sonhadora da uretra.
Chupando ciber-cérebros de todos os mártires, chutando cada James Bond com seus martines, os Wolverines apaixonados, os marines que votam alegremente no sr. Lula, no sr. Bush e se esquecem dos mil tiros ao alto, em nome de alguém como Paulo Francis ou os intestinos de D. Pedro, the first one, the best, the new york times of apocalipse, o cólon, o reto, servindo como cachecol para a Lady Punk, Lady Trash, a deusa grega da juventude viciada em serial killer e séries como Friends: Hebe Camargo.
Andando pop, andando B'52's , andando Carlos Gomes tocado pelo DJ Mau-Mau ( é sério, procurem saber, o fim está próximo, negada), chupando a cidade pela sua ponta de linguiça toda passada nesse hoje de vencimento fatal, filhinho, não coma os iogurtes e os yacults quando a tampinha metálica fica gordinha.
Mamãe, não coma mais nada quando a barriguinha do Nada ficar gordinha, flácida e começar a citar, vixe Maria, vixe Tim Maia, vixe-vice José de Alencar com Ceci e Peri ( sério o lance do Carlos Gomes, afro-genéticos !), vixe, citar Sartre, Freud, Prozac e outros mestres da contemporaneidade Alzheimer, aquele patogista necrófilo e fumante de Halls queimando com poeira cósmica em plantões médicos, aquilo que mostra sangue natural, mais natural que o sangue natural, ao menos a safra do vinho eleito pelo banco Safra, é menos salafrario que o sangue do pobre anjo que foi depenado na noite do Natal.
Andando e beijando os pescoços dos Perus Sadia, já que hoje em dia são os únicos perus confiáveis para se colocar dentro de si. Melhor gripe aviária que gripe viada, dizem as beatas versão Beta, em fase de teste religioso.
Chupando e andando anacondas e outros falos na faliciosidade da meia-entrada na quarta-feira, sim, como não, só a mocinha de bigodes Magritte me pagando pra assistir a filmografia de seus sonhinhos de valsa, salva e merengue.

Sim, amado Wander Wildner, eu também quero uma festa punk e "nicotina, nicotina, entra no meu pulmão(...) sem ela eu não vivo, pelo amor de Deus me passa um crivo !!!",

++++++ Wander, como andando
chupando
beijando
e tudo mais assim,
ainda vem o tísico querendo nos tirar a pouca-delícia permitida do cigarro Derby ultra-killer, long-side B? ++++++

----- Longa é a vida, curta é a arte.
Esse é o problema do ser humaninho. -----

[@] Curta o curta ante que ele desapareça na mediocridade que lhe é própria. [@]

( E, pretinhos de alma branquinha com flúor: é sério sobre o Carlos Gomes, meu conterrâneo, meu igual em admiração lassiva pelo Rubem Fonseca, com o devido nojo Lourousse ao outro, o Alves )

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domingo, 27 de maio de 2007

Boca à fuça Anti-Merlosiana.


Ternurinha padrão típica de acasalamentos e quatro paredes, quando todos te olham e dizem, rapaz isso não é mais idade nem fuça pra escrever sobre a verdade.
Como não tenho uma cidade de praia, já disse algures ( algures, puta palavra legal), sento na beira da privada em chão e fico tocando a descarga. Não se preocupem, já não tenho idade nem treco pra vomitar.
Ligo o som o mais alto possível, respeitando a televisão no quarto ao lado, a piada que acorda todo mundo mas é boa, e minha música é ruim pra dedéu, mas ligo assim mesmo, dizem, que para fazer uma pequena revolução, até as 22:00 pois fiz as pazes com a vizinhança supra sumo sacerdotal.
Como é isso que dizem também: estar com o saco na lua ?
O meu pesa, quem me dera se voasse, se fossem bolas de Dumbo, se alguma emoção balão mágico pudesse dar a exata esperança dos erros ainda que podem ser cometidos numa boa.
Mas nem idade nem fuça, treco, diz mais que o espelho ( riso diabo no corpo ), o cobrador desse busão que é a vida. São vários cobradores, um a cada dia, todos clones de cobradores de clones de dias, tão iguais em si de mim, que quando começo a puxar papo tipo deles, manequins peladinhas de shopping center, me assusto tamanho tamanho enorme tudo desse domingo que parece eterno e o busão faz uma curva, ô, ô, se segura rapá, mas não é nada não, é bossa nova com guitarra, só angústia , pega o cobertor, cobre a cabeça, enfia algodão baby perfuminho rosa bebê, azul bebê, arco-íris baby Genet, nas orelhas.
A cobrança aumenta na medida dos acúmulos de pisadas na bola, bobo de quem deu vexame, tem que comprar a revista "Você S.A." e aprender lá as manhas do atual Eclesiaste. As orelhas gatunas já se levantam se eu não consigo no hoje de sempre busão e curva, sorrir para detalhes como o desatino dos sapatos. A opção pela burrice é um perigo, meu amigo. Quando a ira volta, vem como bolha de peixe monstro, zoião alumiado, dentes de bocarra caverna de carvão empapado, esfregando tudo na cara, colocando bombas pelos lados crucificados da individualidade terrorista, deixando você num deserto árido depois que a coisa fede num impulso de grito, berro, porrada, deixando você armado bem presinho dentro da caixa torácica. Revoluçõenzinhas mela cueca. Já sem idade e sem fuça, treco para topar apoio aos estudantes da USP, saudosos de um maio de 68, numerários encadernados de quem nunca colocou os pés na França, mas possui óculos de tartaruga e explicam tudo segundo adornos adornais e walter benjamins buarques de hollanda com backinho anárquico e estúpido debaixo das árvores do campus. Campinas mesma coisa. Sim, eu-lírico está de férias. Sem idade nem fuça para desgrudar todos os duréx dos trecos que outras pessoas grudaram no salão de festas, nem mais o tédio inventa algo que me divirta, que mané festa, moi chandon ? Festinha avenida paulista ? Festinha torre do castelo ? Festinha Copacabana ? Se ainda eu encontrasse um helicóptero caridoso, bom samaritano de umas figas ao caldo para a sorte do pé de cabra, bem maior se cofre citybank que me sustente a sorte de ócio, ouro de hanna barbera my friends, that's all, bem mais isso que a perna super texana do pernalonga sacanão.
Enumero as cidades em que já pisei com alma, alegria e tudo isso. Que chances tive em Miami, em Nova York ( que maravilhosa janela do hotel chicoloso: um beco escuro de tarô inteiro adivinhatório do meu gozo: negão e negona, esfrega e chupa, meladinho globalizado da safadeza que faz valer a pena...), Buenos Aires( olá, cemitério meu), e até mesmo Poços de Caldas, com suas frutas óbvias e um lugar mal-assombrado que servia de pretexto heróico ao desvirginamento das acatadouras mocinhas poçolépidas e fogosas. Era um hotel. Sempre um hotel. Ainda fujo do buzão e abro pousada autista, deixa de onda sanitária, numa praia deserta - caiçara nos pentelhos da chatice - e monto lá uma vastidão de dois quartos. Me sentirei, faz tempo, bem esperto, sem fazer mal pra ninguém, o que tem sido o importante, sem idade, sem fuça pra outra coisa, trego de ser feliz total nem pensar, vou poder morar em cabana bacana pau e bananeira, sem pagar um tostão a diária meia entrada. Mas para isso teria que aprender algo sobre sushis e sashimis, não me dou bem com o elemento fogo, basta o meu no azar das dobras, o que me obrigaria a uma segunda-feira soberba de aplicação na vara, a de pescar já que do cofre lá dentro, não tive o viés de ganhar o peixe. E quem disse que eu vou sair dessa paradez? E ainda tem o calmante tarja judozão que me rouba os sonhos obrigatórios...
Mas que enrascada, meu chapa.
Pois é.
Passar o tempo.
Até quando?
Até amanhã, caceta.
Mas e quando chegar o amanhã do teu amanhã, vai assim dar uma morrida sem nada de muito alegre depois
dessa
idade
dessa
fuça
desse
troço de ser impertinente ?
Essa é a questão, padre. Essa é a confissão, tia Benta. Essa é a lambança do meu sexo indormente, Socráticos cobradores do buzão em bons termos, apertos de mão, combinações e claro que, revoluções mela-cuecas de satisfação dutifri.
Ah, tem sempre alguém que paga o pato: vou jogar as roupas de baixo de cima da janela do oitavo andar, dó que não dou, isso sim que é baderna, gentinha universitária, povinho ramela de comédia entorpecente no restinho do espírito que me sobra, nem vem que esmurro , ficar pelado em pleno inverno e beijar a madame Pneumonia na boca, com linguão e espelho no teto, até o pneumococo, filhinho meio down, meio emo, ficar com medo de ser contaminado por mim e não o avesso disso, dissos-eu que voam para o ar, que hão de grudar nas caras de cada cobrador do busão cósmico, gente que pisou na bola com a discrição da descrevicionice maquiavélica, retomo, "Você S.A", bem como "Arte da Guerra", e que agora só paga o shozinho de me ver - a troco de alimento semanal e visita íntima - esfregando minhas próprias bolas junto com o parmesão praquele almoção à italiana. Mama na minha, tiazona.
Pelado e fumando um cigarro, busão em chamas, ataraxia de quatro pra mim. Uma cuspida e chulapa !
- Demorô, bicho.
- Também achei, cumpadi, chama duas, chama três que tô pagando.
Agora, dona Calma, se bandeia pra lá, lava as partes e me prepara um bom quinhão de alegria e abandono de ti, não olhe para trás, orfética em mofo, que sou impuras fúrias. Quem for cabeça entende, quem não for, que entre também na festa, qualquer vinho menos aquela geléia do tal merlot riograndense do sul.
Super-peladão cruzando babejante o céu cinzento de todas as cidades, de todas as saudades não vividas.
É isso aí.
Chama mais que tô pagando pra ver quem me toma a idade, a fuça, o troço.
°

terça-feira, 22 de maio de 2007

O Lago Secreto.








Quando lembro dos jardins da infância, constato, não é o menino, mas as flores e matagais que possuem algo de diabólico, incurável no cedo da idade, no alvorecer dos músculos: temos tardiamente a consciência do mal; o saudosismo.


Caminho com Elle pelas alamedas floridas em todas as épocas do ano. Embarcamos no porto há dois meses e só chegamos no dia de hoje. O dia é sol, com espumante, o mar ao longe, atrás da cascata que a mesa de metal, rendada, impõe aos nossos, meus( não divido todas as sensações com Elle, a nossa combinação sobre planos de um amor duradouro), olhos, enfim, o navio e, soterrado nele, um pouco da lógica, se vai em fragmentos simbólicos. Foram dias felizes sobre as águas. Ao menos para Elle, que nunca sabendo da semântica portuguesa sobre seu nome, sentia-se sorrisos. Em mim, sonhos proibidos, os meninos quando eu era apenas menino, as brincadeiras.


- Querida, bebamos para esquecer.

E ela, inocente, "in vino veritas" :

- E também para lembrar.


O que te perturba é o vício da hermenêutica.

Ela me disse isso na tarde em que nos conhecemos em Viena. E durante a noite que se seguiu ao museu, em meu hotel, combinamos a viagem. E o algo de segredo entre nós. Mantimentos de matáforas que asseguravam, de um lado a paixão, de outro, a distância do olhar, típica unicamente dos fantasmas.

O afeto é uma assombração.

Foi isso que respondi, sem cobrar que ela entendesse.


Minha mãe cortava os caules antes que os botões se abrissem. Ela via algo de indecente não não pétalas, mas na queda das mesmas sobre o gramado. Mulher bonita, de uma ruiva coisa que perturbava e excitava todos os meninos, eu o patrãozinho, os outros, joguetes dos humores climáticos, dos desejos que eu impunha em nossos destinos de veraneio. A cada novo ciclo de solstício, meu pai mudava todos os empregados. De seus ombros largos- Elle ficara impressioada diante das fotos- uma cabeça protestatante. Sim, fazer o bem, mas com limites. Se os limites paternos seguiam os fluxos naturais, a moralidade das chuvas antecipadas em seus estudos físicos, a minha expansão vinha dos brotos decepados, que um a um, eu colocava na boca, que um a um, dividia nas bocas dos outros meninos.


Elle disse que pagaria qualquer quantia para dormir em meu quarto, agora apenas mais um quarto, na pousada, o prédio principal, em que durante o check-in, ela me disse que pagaria qualquer quantia por deitar no simulacro atual da minha cama. Como satélites, erguiam-se bangalôs, preferidos pelos turistas comuns, joviais paredes, janelas para a brisa. Meu quarto, com sua ausência de banheiro, era um dos mais baratos, informou o gerente. Elle pareceu frustrada. Para alegrá-la, fomos colher flores, o que, diga-se de passagem, era proibido. Novamente aberta aos sorrisos, Elle me abraçou e disse algo sobre Rimbaud e a gratuidade das cores que a Natureza oferece em sacrifício para o gozo estético. Eu assenti e me senti calmo. A nossa cama, nunca seria a minha cama. Traças da memória. Com o pedido, Elle achou ter atingido algum segredo meu. Simulei um suor de extremidades, sem que ela visse, absorta por uma sequóia. Cuspi nas mãos e as esfreguei. Para confirmar o quão distante Elle estava dos meus medos, perguntei:


- Quer ainda hoje visitar o lago?

- Não, querido. Deve ser cansativo. Vamos reservar um dia para isso. Um dia inteiro!

Ou ela continuava inocente, ou já descobrira que


Eu e os meninos no lago. Folhas boiavam e se entrechocavam. Eu e os meninos boiávamos. E tudo mais. Um jogava, então, jorros de água no outro, até que tudo jorrasse com uma violência de sons que fazia com que os pássaros revoassem, sinfônicos. E quando tudo se calava, os olhos fechavam, tudo jorrava e lábios mordidos. Em silêncio de nunca confessar. Voltávamos por caminhos diferentes. Eu, para a casa sobre o morro. Eles, para seus afazeres precoces. E no próximo verão eles não mais existiriam, qualquer remorso devolvido para as ilhas, de pequenos barcos que os levavam, trechos de suspiros. Segredos como paixões.


O jantar era adequado, pato e uvas. Elle e eu falávamos de caça, e logo sobre as ternuras da carne bem caçada, esperteza do atirador: quando mais perverso fosse, bem escondido, estrategista, melhor seria o sabor. Um sabor de infância mole. Molho de uvas melhores que o vinho, notamos também isso. O que nos espantou: não sabia de antigas ou recentes uvas por aqui. O vinho, o mesmo vinho, poderia ser conseguido em qualquer quanto do planeta, em uma espera máxima de doze horas, segundo nossos cálculos. Mas a uva não. Ressecada, sem umidade, sem sexo. Elle que disse: "Sem sexo". Só conhecendo-a para saber que isso não era desejo em si, mas um avanço de suas peças sobre o tabuleiro: meu corpo nu, meu corpo ainda despelificado. Voltavam por vezes os meninos daquele verão ou outro. Eu fingia tomar minha trilha e quando tinham desaparecido, deitava na terra - úmida - que cerceava a lagoa. E ficava em paz e alguma dor que alienava minha carne de mim mesmo, a satisfação plena antes do primeiro e fundador tombo adulto. Unhas e arranhões que as calças escondiam, mas nunca uma ferida de repulsa. Não, não naqueles tempos. Entrando pelo pórtico, o abraço da mãe, o sorriso compreensivo, empurrado adiante dos ombros, de meu pai.

Na nossa primeira noite, após o jantar, eu e Elle nada fizemos além de fumar, conversar e sentir falta de música. Se ela soubesse minha alma. Não por vergonha, mas pelo jogo que a trouxe aqui. Elucidar-me na raiz de um jardim que lhe agradava o passeio.


Dorminos abraçados e luzes de pesqueiros uniam estrelas e mar. Cortina com vento, algum lugar atrás disso e da pequena floresta, o lago. Tomei o resto do vinho que já pegara no sono, sobre o criado-mudo ao lado de Elle. No dia seguinte iríamos lá. Eu sei que ela exigiria.


Nós dois mergulados até a altura do peito, Elle alta mesmo descalça. Jejum do café.

Ela me beijou a boca.

Eu a tirei de mim. Fiquei de costas para seus lábios, para seus dedos.

Ela me abraçou, Elle.

- Então é apenas isso, querido ? Tais lembranças...

- Apenas é tudo isso.

Revoada de asas, melodia mais requintada, na atualidade.

Elle me abraçou.

Fechei os olhos.

Seu hálito na raiz de meus cabelos já começando a clarear.

- Seu bobo.

- Sim.

- Seu lindo.

- Me...me abrace mais.


Que todos os verões sejam com você, querida.

Que nenhuma embarcação te leve,

não desse momento,

nunca desse instante...


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